Reuniões
Todo final de tarde, os dois senhores morgavam em suas espreguiçadeiras olhando o mar. O cheiro de maresia impregnava o ar. A calma do oceano invadia seus sentidos. Em compasso, até as gaivotas voavam devagar. Vez ou outra um peixe pulava irreverente provocando as aves.
- Sabe do que eu sinto falta, Genésio?
- (silêncio).
- Dos nossos jogos de bocha, lembra?
- Claro, Albertinho, era muito divertido mesmo. E.. porque não voltamos a jogar? Só precisamos mais duas pessoas e teremos as duas duplas.
Os dois abandonam a modorra animados pela ideia. Como nos velhos tempos, mentes ativas e apressadas com planos urgentes e extravagantes. Nessa idade, nada pode ser para amanhã, ou corre o risco de não ser. Velhas agendas telefônicas voltaram a ativa. Ligações a antigos companheiros de armas. Um pode, outro mudou o telefone, ou morreu. Quem? Genésio? Não, não lembro. Após todas as dificuldades ocasionadas por anos de separação, em uma semana de ligações conseguiram, estava criada a LBV, liga de bocha da vetustez. Albertinho, Genésio e mais seis fizeram a escalação oficial do recém-criado grupo. E quinze dias depois fizeram a primeira reunião.
Arlindo, o magro, foi o primeiro a chegar reclamando do horário. – Cinco da tarde é um péssimo horário e não posso ficar até tarde, vocês sabem como é, a patroa regula tudo. Mas adorei a ideia de um clube de jogos, inclusive trouxe alguns baralhos e tabuleiros de xadrez e gamão. Pensei em fazermos alguns campeonatos. O que vocês acham de gamão para começar?
Antes que pudessem responder, ouviram a voz de Antônio Maria. Extrovertido, seu vozeirão ouviu-se do portão. Era o atleta da turma, e continuava sendo. A única indicação de sua idade era a calvície. Trazia dois arcos e uma enormidade de flechas. E já foi gritando: - vamos fazer um campeonato de arco e flecha, quem não aceitar faz um de boxe comigo, ha, há, há. Juntos vieram Ernesto, que pela nossa lembrança, pareceu ter encolhido e Sinvaldo, em passo vacilante, que foi imediatamente apelidado por Antônio Maria de Sinválido. O relógio bateu cinco e meia quando finalmente completaram o grupo Flodoaldo e João Batista. Foram servidos salgadinhos na sala onde todos se acomodaram. Bebidas diversas e fartas, desde cerveja, chá, café e sucos. Conversas dispersas e lembranças voaram enquanto o tempo passava. Quando Genésio e Albertinho tentaram falar sobre bocha, todos começaram a falar juntos sobre seus esportes prediletos e qual deveria ser escolhido pelo grupo. Nada se resolveu, mas o encontro foi interessante. Sempre é bom rever velhos amigos. E marcaram novamente para a próxima semana. Na semana seguinte praticamente repetiu-se a primeira. Todos falando juntos, cada qual com opinião diferente. Antônio Maria queria extrapolar o grupo e fazer campeonatos abertos ao público. Arlindo e a ala mais intelectual preferiam jogos de tabuleiro. Genésio desanimado olha com cumplicidade para Albertinho e saem sorrateiramente. Enquanto o bando discute, os dois deleitam-se com o pôr do sol no mar. Mais um final de tarde, e na praia, apenas os dois velhos descansando em suas espreguiçadeiras.
- Sabe o que eu sinto falta Genésio?
- (silêncio).
- Dos nossos jogos de bocha.