HOMEM VOA?
Não, não se trata da edificante história de Santos Dumont, que respondeu afirmativamente a essa questão e dedicou sua vida a provar que estava certo. Nem da história de Walt Disney, que respondeu do mesmo modo à pergunta “elefante voa?” e acabou criando o elefante Dumbo. Quero referir-me a um personagem de Will Eisnner, considerado um mestre dos quadrinhos.
Esse personagem, de nome esquisito, Gerhard Schnobble, descobriu, quando criança, que sabia voar. Era uma alegria pular do último andar do velho pardieiro no Brooklin e ficar planando como os pássaros, tirando fininho dos postes, ver jogo de beisebol de graça, empoleirado em cima da arquibancada.
Mas os pais descobriram e acabaram com a alegria do menino: onde já se viu ficar voando por aí, como um desocupado? O que os outros vão dizer? Sentindo-se culpado, o pequeno Gerhard pendurou as asas, metaforicamente, é claro, pois não possuía asas e voltou a proceder como um menino comum, até esquecer-se do prodígio, cuja lembrança ficou em seu subconsciente.
Após décadas de uma vida medíocre, frustrado, o pequeno Gerhard (não era mais menino, mas continuava pequeno no tamanho) lembrou repentinamente que um dia havia voado. Será que ainda conseguiria ? E resolveu assombrar o mundo. Já pensaram? O Homem-Pássaro estaria em todas as manchetes. Viraria grife de roupa masculina, marca de desodorante ou, no mínimo, de ração para aves.
Suas esperanças duraram pouco. Conseguiu voar, sim, mas minutos após decolar de cima do Empire State uma bala perdida o atingiu mortalmente. Caiu como um passarinho que levou pelotada. Ninguém chegou a perceber que Gerhard Schnobble havia voado.
Não é uma história comovente? Quantos não vestem a pele de um Gerhard Schnobble? Deixam algum talento precoce soterrado na memória e seguem uma vida burocrática. Quando resolvem dar o vôo, mostrar por que vieram ao mundo, as asas já estão enferrujadas.