Meus 50 anos

“E vamos deixar de ter preconceito contra a velhice, até porque, de todos os preconceitos idiotas, este é o mais idiota de todos: mais dia menos dia vamos todos, homens e mulheres, negros, brancos, pardos, azuis e amarelos, envelhecer.

Isso é, se tivermos sorte.”

Foi assim que Cora Ronai encerrou seu texto magnífico de revolta contra o veneno que a mídia jogou sobre a imagem de Vera Fischer na internet. Aos 50 anos, venho sentindo na pele os efeitos da “não-juventude”, da gravidade, das limitações, e tenho que tomar algumas atitudes e decisões que vão influenciar o comportamento das pessoas em relação a mim até o fim da minha vida.

Não quero ouvir que sou uma velha com cabeça jovem. Não, não gosto das cabeças jovens. Algumas são vazias, são fúteis, falta conteúdo, falta esperteza, falta experiência. Serei uma velha com cabeça de velha, mas muito boa! Gostaria, sim, de ter um corpo jovem, duro, firme e capaz. Mas não dá pra ter as duas coisas, né? Então vou aceitar meu corpo como ele está e assumir algumas coisas para tornar mais fácil a minha jornada.

Os cabelos, já não os pinto.... e estão lindos!! Brinco que vou ao cabeleireiro ativar minhas luzes prata, já que, quando corto, os brancos aparecem mais. Ainda não me sinto capaz de usar um biquíni, como fez a Beth Farias, mas eu chego lá. Meu rosto, graças à genética da minha mãe, ainda não tem rugas, mas sei que elas virão. Vou tentar olhar cada uma como uma marca de um tempo, uma experiência, uma época.

Ainda sou produtiva, e muito. Não vou aceitar que as pessoas me diminuam profissionalmente por conta da idade. Sou capaz, muito mais capaz do que um jovem que nunca enfrentou o mercado de trabalho, do que uma jovenzinha que nunca foi para uma jornada de trabalho de 16 horas com uma crise de endometriose, pressão em 18 x 12, quase tendo um “peripaque”, e suportar calada, ser elogiada no final do evento e ir direto para o hospital. Não, um jovem de 20 anos não suportaria isso. A responsabilidade que vem com a maturidade é impagável. Se não me firmei no mercado com uma profissão, foi porque tive que manter minha casa e minha vida desde sempre. Não tive faculdade paga, não tive aluguel pago, roupa, médico, remédio, alimentação. Eu me banquei a vida toda e não é justo que, após os 50, os empregadores achem que sou incapaz.

Não quero ter vergonha de tirar a roupa diante do meu marido. Eu teria se fosse uma relação superficial, mas isso a gente tem quando jovem. Aos 50 você já se estabilizou emocionalmente e, se não, já optou por ficar só, porque relacionamentos fúteis só trazem a satisfação sexual, mas o estável traz noites de boa conversa, companhia para o vinho, para o filme, ombro para chorar, apoio nas horas difíceis. E, eventualmente, um elogio sincero.

Não quero usar maquiagem, não quero salto alto. Quero andar confortavelmente vestida, porque já sofri demais quando jovem. Os pés doíam, tinha que usar roupas que não gostava, mas que estavam na moda ou que me deixavam sexy. Hoje quero minha cara lavada, pra não ter que perder uma hora limpando todo aquele “reboco”. Quero uma roupa fresca que alivie os calores da menopausa e uma sandalinha rasteira que não me cause dores musculares e adormecimento nos pés.

Não quero me preocupar com futuro (?). Ele é agora, aqui, e o tempo voa. Quero viver cada minutinho para não me arrepender um dia. Dinheiro é bom pra gastar, não pra guardar. É claro que, em alguns momentos, eu gostaria de ter um dinheirinho guardado, pra não passar por certas dificuldades. O que me faz lembrar que, se eu tivesse trabalhado muito para guardar esse dinheiro, eu teria perdido um tempo precioso da minha vida. Não me arrependo de nada que vivi, de nada que deixei de viver. As coisas aconteceram como tinham que acontecer.

Quero dedicar muito tempo à minha família e aos meus amigos sinceros. São eles que estarão ao meu lado quando for partir. São como plantas que você cultiva, rega, aduba e depois colhe belas flores e frutos. Amo minha família e meus amigos e sei o valor que eles têm.

Quero fazer o que tenho vontade. Quero poder dizer mais “nãos” e impor mais o meu ponto de vista. E não quero me preocupar com que os outros pensam, é problema deles, não meu.

Sem hipocrisia, eu faria uma plástica se pudesse. Transformaria minhas carnes moles em duras, levantaria o que caiu, esticaria o que ficou flácido. Mas se não é possível, vou brincar, sacanear a mim mesma, rir das minhas limitações, e serei a primeira a assumi-las, sem problemas. Brinco com minha futura velhice, porque quero chegar lá de bem com a vida, amando cada dia vivido, cada ruga adquirida, cada flacidez instalada. Se Deus quiser que seja assim, se Ele quiser que eu viva muito tempo, terei que passar por isso e vou passar como tem que ser, feliz.

Sol Sampaio
Enviado por Sol Sampaio em 29/11/2015
Reeditado em 01/05/2017
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