Zona do Sossego

Prezado Amigo Blá-Blá-Blá:

Mando notícias aqui de Pelotas.

Não te escrevi mais por conta do trabalho. Quando chega a noite não tenho vontade de pegar na caneta e no papel de tão cansado. Às vez escrevo, mas acabo nem colocando a carta no Correio, pois as notícias são sem graça, tamanha é a rotina diária que vivemos.

A patroa continua fazendo seus biscates, cozinhando para fora, fazendo concorrência com a Dona Narola. Zé Leandro, teu afilhado, continua estudando no colégio, mas não passa de ano nunca, sempre toma pau em matemática e diz que a professora é que persegue ele. Mas nunca vejo ele estudando. Vive saindo com os amigos, tomando cerveja Calsbergue com o dinheiro da mãe, fumando uns mata-ratos Continental escondido (eta cigarrinho ruim) e andando de bicicleta. Ele namora todas as empregadas da vizinhança, o safado. Mas tu sabe que o guri é meio burro mesmo.

Eu abandonei a Maria Amália. A patroa descobriu e deu um cu-de-boi desgraçado. Foi uma lambança dos diabos. Minha sogra se meteu, querendo que a Abigail se separasse de mim. Mas acabou que a Abigail, que é de faca na bota, deu uns pescoções na Maria Amália e ficou tudo por isso mesmo, só deixou a coitada toda lanhada. Foi até bom, porque já não estava mais em condições de sustentar duas mulheres. Não estou dizendo que eu não dê mais no couro, mas o dinheiro é que estava ficando curto. O guri que eu tive com a Maria Amália já começava a dar despesa.

O outro meu filho, o Osmarino, que tu chamavas de Trinta e Dois, depois que ele fez 32 erros num ditado de português (te lembra?) agora é que começou a trabalhar na loja Velocino Torres. Saiu da Confeitaria Nogueira depois que descobriram aquele esquema dos doces que ele trazia para vender na vizinhança. Agora ele traz é uns cortes de fazenda muito bons para vender, todas as semanas.

Dos nossos amigos lá da Zona do Sossego tenho visto muito é o Hugo Sabugo. Ele vende revistas na rodoviária. Ainda continua cheio de tiques, apertando os cantos dos dedos e contando os quadrinhos de cada página dos gibis. O primo dele o Faísca, é que parece que faleceu. Era feio o desgraçado!...Te lembra daquela vez que o Hugo foi expulso do Cinema Capitólio porque estava agarrando uma mulher? Bah! Que vexame! Eu nem queria mais ir ao centro com ele! Me lembro que a gente tinha ido ver um filme, com o Xalton Eston e o Roberto Mitiscúm. Trabalhavam bem esses dois. Agora nem tenho ido mais ao cinema. Muito caro. Fico vendo novela com a patroa na tevê.

Outro que eu encontro de vez em quando é o Mabuze! Ele virou biólogo. Continua aloprado. Te lembra que ele nos dizia que tinha aberto umas bactérias em casa? Tá rico. Sempre foi. O pai dele era dono da Padaria Industrial e eles comiam no Galeto Cambruzzi. A gente comia era bauru no Bife Sujo. E fiado! E ainda ficava vendo desenho do Udi-udi numa tela que tinha na esquina do Aquário, de sapato Maria-Mole. Tempo bom! A gente não tinha dinheiro nem pra lustrar o sapato. Tinha que roubar Zezo no supermercado.

Quando eu deixei aquele negócio de contrabando de calça Lee, que me dava uma boa renda, acabei virando inspetor no Colégio Pelotense e estou lá até hoje. Isso no tempo que calça Lee era melhor que Brim Coringa. Agora todo mundo compra calça até o supermercado. O que tá dando agora é vender droga, mas isso eu não me meto. É muita rafuagem. Coisa de chinelão.

Espero que tu tenha resolvido o teu problema do imbigo e tejas melhor de saúde. Vamos ver se a gente se encontra pra tomar umas cachaça com mandiopan.

Se tu encontrar o Culéco, diz pra ele aparecer.

Abraços

Zé Bronha.