Das coisas que terminam em dor

Final de tarde com direito a Sol brilhando mais forte do que o comum. Atrás das grades ele não nasce quadrado. Nasce formando feixes de luz. Luz intensa que por vezes os deixava tão cegos a ponto de não conseguirem enxergar a igreja secular que ficava do lado de fora. No mundão. Na calçada. Do outro lado da rua.

O educador iniciou o encontro daquele dia com o apagador em mãos dizendo que gostaria de ouvir estórias que acalentavam o coração e que transportavam para outros lugares.

Pois bem. Bastou o cheiro agradável de café invadir aquela sala lotada para que muitas lembranças chegassem à memória daqueles que já tinham perdido as contas de quanto tempo estavam ali. Ali naquele lugar onde o relógio calcula os minutos de um jeito diferente e constrangedor.

O cheiro do café ficou mais forte. Um deles disse que é muito diferente passar o café no coador de pano com aparador para não queimar as mãos. Reforçava que preparar um bom café não era qualidade de amador. Contou ainda que todas as tardes (antes de fazer os “seus corre”) comprava leite, pão e mortadela e distribuía para as crianças que moravam por ali e como todo trabalhador procurava sempre realizar suas tarefas como um agente transformador.

As lembranças falaram mais alto. De repente seu olhar ficou congelado e ele não conseguiu concluir sua história porque as lágrimas derreteram antes. Por alguns segundos as pessoas que ali estavam se tornaram atentos ouvintes daquele narrador.

Como cúmplices improvisados sabiam que o próximo capítulo não seria escrito.

Quitéria Luma
Enviado por Quitéria Luma em 23/11/2015
Reeditado em 21/11/2017
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