De noites infantis
Uma noite eu acordei, olhei para o relógio e ainda era o meio da madrugada. Virei para o outro lado e tentei continuar a dormir, mas não consegui. Já cansado de todo aquele esforço, desisti: coloquei as mãos por baixo da cabeça e me dispus a pensar, pensar em alguma coisa que estivesse me afligindo a ponto de tirar o sono. E não sei exatamente por qual associação de ideias, mas o fato é que me ocorreu a lembrança de outras noites, de noites infantis, em que eu também estava acordado e por algum motivo precisava chamar a minha mãe. Não lembro, para ser sincero, de nenhum motivo que tenha me levado a chamar a minha mãe de madrugada, mas lembro que eu chamei algumas vezes, e lembro que, antes de chamar, eu pensava bem se aquele era mesmo um caso de se chamar a mãe da gente, ou se eu podia esperar que amanhecesse.
E de repente saia: “Mãããe”. Eu mesmo me espantava com o som que havia saído da minha boca, no meio daquele silêncio. Fosse como fosse, estava feito, eu havia chamado a mãe e isso me aliviava. A mãe escutava já da primeira vez. Ela dormia no quarto em frente e, se não por isso, também tinha o sono fraco. Eu podia ouvir o barulho que ela fazia ao se levantar. Não demorava e a porta do quarto abria: a mãe vinha ver o que acontecia.
Isso faz muito tempo, é claro, e eu nem ao menos moro com a minha mãe agora. O diabo é que, mesmo assim, continuaram acontecendo coisas na minha vida, e coisas que, olha, vou falar a verdade, a gente não sabe o que fazer. E nessas horas eu gostaria de ainda poder gritar do meu quarto, de ser ouvido e de saber que alguém viria para resolver o meu problema. Porque mãe sempre resolve o problema (é como diz aquela tirinha do Calvin: eles não deixam você ser mãe se não souber o que fazer).
Mas a mãe não vem, não mais, não vem ninguém – permaneço só, no meu quarto. E então eu me dou conta de que não tem mais volta, que eu cresci mesmo, para sempre. E, o que é pior, sem saber tudo o que era preciso que eu soubesse.