Ainda sangra!

Eu tinha 8 anos quando cai e ralei brutalmente meu joelho. Doeu. Chorei. Mas não foi um fato marcante na minha vida. Digo que caí aos 8 e na verdade não me recordo dessa queda em específico. O fato é que eu era tão apegada ao chão, que me atirava nele sem pensar duas vezes. Caí aos 5,6,7,8,9... Infinitas vezes, em diversas ocasiões. E era sempre assim: Eu caía. Me machucava. Sangrava. Chorava. Passava merthiolate ( na época era vermelho)e doía ainda mais. Enfim Cicatrizava, mas não pense você que eu sossegava. Não ... Tirava a casquinha pra ver se ainda doía e adivinhem ?! Doía, sangrava, soprava e o sangue (novamente)secava. Em algum momento caí novamente e acabei esquecendo dos arranhões antigos. Voltei minha atenção ao novo machucado que doeu. Sangrou.Cicatrizou, tirei a casquinha, doeu... Era uma rotina metódica e não entendo bem o que me levava a fazer isso. Talvez seja alguma tendência masoquista que possuo e ainda não tenho conhecimento, ou talvez seja algo corriqueiro de toda criança. Minha mãe dizia para não mexer na ferida ou ficaria com cicatrizes pelo corpo. Pois é, fiquei! Hoje elas estão claras, qualquer pessoa não veria facilmente, mas eu sim. Afinal, posso não lembrar de cada tombo que levei na vida, mas me recordo de cada marquinha que tenho comigo. Sei muito bem onde fiz cada uma delas e o quanto doeu.

Eu deveria ter abandonado esse costume horrível, mas não larguei. Ainda hoje tiro casquinhas das minhas feridas. Claro que não são físicas, mas o processo é o mesmo. Dói , machuca,choro, esqueço . Em seguida lembro e aí dói,mach... É mais ou menos como o número 8, sem começo e nem fim.

Agora que comecei a escrever posso pensar, quão sábia minha mãe é, pois até hoje o que ela disse se concretiza. Cada vez que mexo nas minhas feridas, elas aumentam e a cicatriz se aprofunda e toma um lugarzinho em mim. Conforme o tempo passa, elas vão clareando e os outros nem perceberão quão profundas e dolorosas eram. Eu sim... Eu sempre saberei.Sempre!

Enfim, é assim que somos não é mesmo?! Sofremos pra não lembrar, e lembramos por livre e expontânea vontade. Será que é da essência do ser humano gostar de sofrer ? Talvez. Interpretemos então de forma positiva. Pensemos que é algo doloroso, mas que as vezes aprendemos mais com a dor do que com a carícia. Então todo o aprendizado é válido.

A marca de um sorriso
Enviado por A marca de um sorriso em 19/11/2015
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