Assim descaminha a humanidade

Convidada a participar de um evento de cunho profissional, compareci pontualmente à hora marcada, apesar de ser um dia extremamente corrido e repleto de afazeres. Entretanto, qual foi o meu desgosto ao constatar que, mais uma vez, os atrasados seriam os privilegiados em detrimento daqueles que honram horário e compromisso. As atividades se iniciaram exatamente com uma, sim senhor, UMA hora de atraso! Nesse tempo preciosíssimo, durante o qual poderia ter desenvolvido algumas das minhas obrigações em suspenso, pus-me a refletir e intimamente analisar alguns fatos que tenho observado e vivenciado em nossa sociedade, entre eles essa situação ora vivida e tão desgastante.

Refleti a respeito do que leva uma equipe a marcar o início de um evento, para determinado dia e hora, se não tem certeza que dará conta da organização em prazo hábil para a sua realização. Em contrapartida, o que pensa uma pessoa que assume o compromisso de participar de determinada atividade e chega meia hora, quarenta minutos, uma hora (ou mais) após o início, interrompendo e atrapalhando o andamento da mesma? Por que algumas pessoas se dispõem a assistir/participar de uma palestra, um curso, uma cerimônia e ficam a conversar com a pessoa ao lado, todo o tempo, não ouvindo o que se trata e não permitindo que os que estão a sua volta se concentrem no que está em desenvolvimento? O que leva o ser humano, e aqui falo exclusivamente de um adulto, graduado e muitas vezes, pós-graduado, a desrespeitar um professor, um palestrante, um orador ao manipular e utilizar o celular no ambiente e em momentos em que o outro fala, discursa, ou ministra uma aula? Ou sente-se plenamente à vontade para levantar-se, retirar-se e voltar ao local a qualquer momento e por várias vezes durante a fala do preletor, como se tal atitude fosse a coisa mais natural? Por que um acadêmico, que paga altas mensalidades pelo curso superior se alegra e festeja o fato de o professor não comparecer para ministrar as aulas, constituindo-se como um consumidor que paga e não usufrui plenamente do serviço contratado?

Exasperada com essa realidade reportei-me a outras situações igualmente irritantes, como quando um profissional formado, capacitado e remunerado para exercer determinada função não cumpre os prazos e obrigações, trazendo prejuízos ao bom andamento do processo no qual está inserido e também às pessoas cujo trabalho é articulado e dependente do seu.

Nesse momento veio também à memória os pais e mães que abrem mão da sua autoridade e não relutam em me dizer que não sabem mais o que fazer com o filho que não lhes obedece! É ele quem manda nos adultos da casa e a sua vontade sempre prevalece...e o filho só tem oito anos!

São situações que se configuram como rotineiras e não como exceção, o que muito me assusta e constrange, pois toda ação, principalmente a repetitiva, traz em seu bojo um significado relevante. E que significados são esses?

Refleti, levantei hipóteses, mas penso que é necessário mais que simples reflexão para encontrar as respostas: será falta de educação? De vergonha? De respeito? De bom senso? Será que o certo passou a ser errado, dispensável, e o errado passou a ser certo e aceitável? Ou serão marcas das novas gerações, em que cada um se constitui como ser humano que pouco se importa em levar em conta as necessidades, os valores, o bem estar e a humanidade do outro?

Ou será que é a minha visão de mundo, de sujeitos, de sociedade, que está ultrapassada, se cristalizou em estereótipos ideais, não acompanhou a evolução do mundo e da civilização? Não sei... o que tenho certeza é que não gosto nada desses fatos e comportamentos que vejo, vivencio, não entendo e que me afligem sobremaneira nesses tempos em que contemplo, ora incomodada, ora angustiada, ora incrédula, ora irada, alguns descaminhos da humanidade!