A noite de sábado
Ah, os embalos de sábado à noite! Os da última semana foram tais que não voltei para casa. E devo confessar que era exatamente isso o que eu planejei, isto é, eu estava mesmo disposto a virar a madrugada bem longe da minha cama. Sai de casa perto das oito horas e fui a um shopping, um que se vangloria de ser “a segunda casa” dos seus clientes. Pois para mim ele haveria de ser a primeira.
Chamei o elevador e subi ao segundo andar. No segundo andar não tem loja de shopping, tem só consultórios, clínicas, essas coisas todas que não abrem em um sábado à noite. Ou quase todas. Porque eu vi luz dentro de uma clínica e bati à porta. Uma mulher me viu e veio abrir, sem surpresa alguma: ela já estava me esperando. Ah, eu e essa mulher ficaríamos ali até o amanhecer.
A verdade é que eu precisava fazer um exame. Um exame que só pode ser feito à noite. Um exame em que você dorme e o computador mostra tudo o que se passa com você durante o sono. Era, com o perdão da palavra, uma polissonografia. Eis aí o programa do meu sabadão.
A mulher me levou para um quarto, um quarto tão bonito, com a cama bem arrumada e tudo mais, parecendo tão confortável que por um momento considerei a possibilidade de alugá-lo. Mas dali a pouco a cama estava cheia de fios, e um fio não tem outra função senão a de ser enfiado em algum lugar, ou, o que é pior, em alguém.
Vesti o meu pijama. É branco com listras azuis, um amor. E a mulher começou a colocar eletrodos em mim. Passou um gel no meu cabelo e dá-lhe prender eletrodo na cabeça, no pescoço, até na perna. Essa é uma operação demorada e, se eu não tivesse problemas para dormir, é bem provável que tivesse pegado no sono ali mesmo e fosse dispensado de fazer o exame. Em seguida ela me mandou deitar, colocou um grampo no meu dedo e mais uns fios no nariz. Por fim, apagou a luz, desejou-me boa noite (era cínica, a mulher) e saiu do quarto.
Virei de lado, cuidando para não tirar nenhum fio do lugar. Descobri uma maquininha que monitorava os meus batimentos cardíacos. Gostei daquilo. Conforme eu me erguia ou me virava, o meu coração batia mais. Mas eu estava ali para dormir e por isso fechei os olhos. Só que não adiantou muito. Comecei a prestar atenção no barulho do ar-condicionado. Não estou acostumado a dormir com ar-condicionado. Troquei de lado, não sem antes enroscar minha perna em um fio, virei o travesseiro e tentei de novo. Mas o sono não vinha. Isso me deixou inquieto. Vira para cá, vira para lá, até que eu consegui tirar um fio do lugar. Imediatamente soou um alarme e a mulher veio prendê-lo. Veio, prendeu e foi embora.
As horas passavam e, dormir que é bom, nada. No quarto ao lado alguém roncava (mais gente estava comigo naquela balada). Já devia ser alta madrugada. Uma hora deu vontade de fazer xixi, mas isso daria uma trabalheira dos diabos. Resolvi segurar, até porque logo iria amanhecer e eu já aceitava a ideia de passar a noite em claro.
Às seis da manhã a mulher veio de novo e disse, na cara dura, “bom dia”. Livrou-me daquela fiarada e eu fui tomar banho, pois meu cabelo estava puro grude. Sai para a rua com uma dor de cabeça do cão. A noite chegara ao fim e aquela ressaca prometia.