Pode ser uma pantomina
Assistindo a votação de um projeto na câmara dos deputados, eu percebia um clima de arena de futebol. Os parlamentares debatiam uma polêmica proposta de anistia a contraventores. Somente depois de utilizadas todas as munições, é que tomaram a decisão de solucionar a questão nos votos, apelando aos preceitos democráticos.
A parte dos congressistas vencida apresentou uma emenda, para remediar a traumática derrota e corrigir o que julgava desarrazoado no projeto. Logo, os ânimos de ambos os lados se acirraram. Não era mais possível ver a diferença entre deputados vencedores ou derrotados na escrutinação e votação do temeroso projeto.
As lideranças partidárias voltaram a disputar com ágeis argumentos os votos dos seus pares indecisos. Vencer a nova batalha era o estímulo que passou a vigorar entre os deputados pró ou contra a emenda.
Diferentemente dos nossos gladiadores, minha reação foi de não assimilação da derrota, não aceitava a vitória do impertinente projeto, por irrisórios votos de diferença. Reagi, tal se tivesse acabado de ver o vôlei do Brasil perder para Argentina no ‘tiebreaker’. Entretanto, mesmo que tardiamente, recobrei minha atenção e passei a apreciar vigilante o novo embate.
Houve um momento em que os deputados abandonaram os jargões típicos, deixando de lado os pronomes usualmente recomendados para os diálogos entre os integrantes da Câmara. Pareciam mais operários fazendo passeata de greve, do que pessoas detentoras de mandato popular.
Acreditem. Os favoráveis, à emenda, se puseram a saltar e gritar, protestando contra a decisão do deputado que presidia a tumultuada sessão, que não queria permitir votação nominal da emenda. O jogo regimental é que dava as regras.
Inesperadamente, uma união, uma força forte e invisível, parecendo superar a gravidade, fez com que parlamentares, pró-emenda, saltassem abraçados e gritassem como se estivessem distantes da terra, lembrando a dança indígena. Diante do rebuliço, o presidente teve que ceder.
Discursos ardorosos foram despendidos na tribuna. Os contra-argumentos não foram suficientes para desagregar a paixão do coeso grupo que se formara. A causa se tornou uma insurreição e agregou, até mesmo, deputados que votaram a favor do projeto, que exalavam pelas narinas ventos arrependidos.
A emenda seria como quimioterapia, para extirpar os possíveis malefícios do alienado projeto. Sobretudo, como desencadeador da indignação popular, que poderia insurgir das cinzas, contestar e abominar a nova regra. Esta instigante norma viria a permitir a anistia de descaminhos cometidos contra o erário brasileiro.
Eu não concordava com o abuso dos nossos representantes. Os beneficiários da lei receberiam indulto de seus erros em troca de pagamento de impostos, e, dentre estes, também estariam os dos próprios legisladores. Mas, se aprovada, a emenda excluiria os detentores de cargos eletivos e de funcionalismo público do rol de beneficiários desse projeto, mitigando a má impressão que este causava. Porém, à revelia da população, o projeto ainda anistiaria indivíduos, que locupletaram e abalaram a ética do país.
A coesão do grupo a favor da emenda estava respaldada numa mistura de medo e coragem. Os deputados estavam entre a cruz e a espada. Porque se votassem contra assinariam a confissão de que legislavam em causa própria, se a favor excluiriam a si próprios da lei.
Quiçá, por isso, se juntaram. Inesperadamente, se abraçaram, pularam e gritaram palavras de ordem. Tudo indicando que o desespero pode unir as pessoas. Como consequência o novo grupo venceu a batalha, aprovando nos votos a emenda, o frágil sustentáculo moral desse projeto, que anistia certos contraventores.
Mas alguma coisa ainda incomodava. Não que eu torcesse contra a emenda, mas, porque a desconfiança me invadia. Sobretudo, quando me lembrei de que ‘laranjas’, usadas na contravenção, iriam se beneficiar do projeto original, a emenda não os excluiu.
Sim. É degradante, se for verdade. Se por ventura, fomos iludidos. Eu, alguns parlamentares sérios, o povo e você leitor. Se na verdade, participamos de uma sessão teatral, de uma execrável pantomina.
A parte dos congressistas vencida apresentou uma emenda, para remediar a traumática derrota e corrigir o que julgava desarrazoado no projeto. Logo, os ânimos de ambos os lados se acirraram. Não era mais possível ver a diferença entre deputados vencedores ou derrotados na escrutinação e votação do temeroso projeto.
As lideranças partidárias voltaram a disputar com ágeis argumentos os votos dos seus pares indecisos. Vencer a nova batalha era o estímulo que passou a vigorar entre os deputados pró ou contra a emenda.
Diferentemente dos nossos gladiadores, minha reação foi de não assimilação da derrota, não aceitava a vitória do impertinente projeto, por irrisórios votos de diferença. Reagi, tal se tivesse acabado de ver o vôlei do Brasil perder para Argentina no ‘tiebreaker’. Entretanto, mesmo que tardiamente, recobrei minha atenção e passei a apreciar vigilante o novo embate.
Houve um momento em que os deputados abandonaram os jargões típicos, deixando de lado os pronomes usualmente recomendados para os diálogos entre os integrantes da Câmara. Pareciam mais operários fazendo passeata de greve, do que pessoas detentoras de mandato popular.
Acreditem. Os favoráveis, à emenda, se puseram a saltar e gritar, protestando contra a decisão do deputado que presidia a tumultuada sessão, que não queria permitir votação nominal da emenda. O jogo regimental é que dava as regras.
Inesperadamente, uma união, uma força forte e invisível, parecendo superar a gravidade, fez com que parlamentares, pró-emenda, saltassem abraçados e gritassem como se estivessem distantes da terra, lembrando a dança indígena. Diante do rebuliço, o presidente teve que ceder.
Discursos ardorosos foram despendidos na tribuna. Os contra-argumentos não foram suficientes para desagregar a paixão do coeso grupo que se formara. A causa se tornou uma insurreição e agregou, até mesmo, deputados que votaram a favor do projeto, que exalavam pelas narinas ventos arrependidos.
A emenda seria como quimioterapia, para extirpar os possíveis malefícios do alienado projeto. Sobretudo, como desencadeador da indignação popular, que poderia insurgir das cinzas, contestar e abominar a nova regra. Esta instigante norma viria a permitir a anistia de descaminhos cometidos contra o erário brasileiro.
Eu não concordava com o abuso dos nossos representantes. Os beneficiários da lei receberiam indulto de seus erros em troca de pagamento de impostos, e, dentre estes, também estariam os dos próprios legisladores. Mas, se aprovada, a emenda excluiria os detentores de cargos eletivos e de funcionalismo público do rol de beneficiários desse projeto, mitigando a má impressão que este causava. Porém, à revelia da população, o projeto ainda anistiaria indivíduos, que locupletaram e abalaram a ética do país.
A coesão do grupo a favor da emenda estava respaldada numa mistura de medo e coragem. Os deputados estavam entre a cruz e a espada. Porque se votassem contra assinariam a confissão de que legislavam em causa própria, se a favor excluiriam a si próprios da lei.
Quiçá, por isso, se juntaram. Inesperadamente, se abraçaram, pularam e gritaram palavras de ordem. Tudo indicando que o desespero pode unir as pessoas. Como consequência o novo grupo venceu a batalha, aprovando nos votos a emenda, o frágil sustentáculo moral desse projeto, que anistia certos contraventores.
Mas alguma coisa ainda incomodava. Não que eu torcesse contra a emenda, mas, porque a desconfiança me invadia. Sobretudo, quando me lembrei de que ‘laranjas’, usadas na contravenção, iriam se beneficiar do projeto original, a emenda não os excluiu.
Sim. É degradante, se for verdade. Se por ventura, fomos iludidos. Eu, alguns parlamentares sérios, o povo e você leitor. Se na verdade, participamos de uma sessão teatral, de uma execrável pantomina.