Pobre não tem tempo pra traumas.

Por mais que estejamos massacrados com as visões do que deveriam ser anomalias... mazelas sociais, o leque de choques às vezes surge com um evento repleto dos clichês urbanos; corriqueiros na vida dos centros, hoje ainda mais falidos, das metrópoles e, claro, no Recife não é diferente. A prefeitura faz o trabalho dela, criticado por uns, festejado por outros, pelas mais diversas razões. Esquina da Av. Nossa Senhora do Carmo com Rua Duque de Caxias: A avenida, larga e de trânsito intenso, quase não permite ambulantes. A Duque de Caxias, rua de pedestres ladrilhada com aqueles blocos de cimento que há coisa de 10, 15 anos passou a ser comum em todas as cidades. Composta de lojas de confecções, lanchonetes, livrarias etc. ela certamente é patrulhada pelos fiscais para impedir o acesso de ambulantes. De repente um barulho: uma Kombi adentrou à rua vindo da avenida quase atropelando os distraídos. Dela desceram 6 ou 7 fiscais para surpreender um casal de vendedores de churros que haviam estacionado seu carrinho cor de alumínio a poucos metros da tal esquina. Um alarido, uma gritaria! Transeuntes se aglomeravam em torno do circo. O desespero da mulher cortava o coração. Os fiscais puxavam o carrinho enquanto a ambulante, que não o largara, era arrastada para o lado que o carro rodopiasse. Um casal próximo discutia porque o marido queria ir em auxílio da ambulante e a mulher não permitia. – Você é “adevogado?” “Pulíça?” Ele. Por sua vez murmurava apupos de revolta ante a injustiça. Percebia-se que todos os que olhavam formavam no semblante um ar de reprovação. Tenho comigo que o clima era tão desfavorável à apreensão que os fiscais desistiram, porém não antes do marido, que estava ausente, retornar para ajudá-la contrabalançando um pouco mais o cabo de guerra que o carrinho de churros heroicamente suportava. Enquanto uma senhora reclamava do fino que a Kombi tirou nela quando chegou, o casal saía com o carrinho como em fuga sob os aplausos da recém formada plateia. Ninguém falou que se ouvisse, mas parecia bradado no ar o lamento por toda energia gasta em tão pueril infração enquanto a violência letal transborda pelos elásticos sacos da tolerância e os hipócritas gerem cinicamente as suas fortunas vendo triunfar os argumentos que fragilizam as leis que os beneficiam. Aqueles aplausos pareciam ser muito mais um grito de desabafo do que uma reprovação em si. Mais à frente outro homem fardado, abruptamente, interrompe o trajeto do casal do carrinho de churros.

- Quanto é?

- Um real.

Pobre não tem tempo pra traumas.