George Washington

A melhor cozinheira que conheci foi uma negra, digo, uma afrodescendente, de Arcoverde chamada Vicência. Olha, hermanos, minha saudosa mãe foi uma grande cozinheira, mas no item carnes perdia para Vicência.

Ela era muito engraçada, tinha umas tiradas arretadas, muito franca e direta, destestava cochicho, só falava alto. Detalhe: não trabalhava fixa na casa de ninguém. Só ciozinhava em festas, nno que hoje chamam de eventos. O que fazia para viver era criar porcos, tinha um chiqueiro enorme em casa, diziaque ganhava muirto mais cevando os bacurins com lavagem que apanhava em algumas casas, inclusive na nossa. Isso era comum na Arcoverde do final dos 50 e começo dos 60.

Vou contar um causo verdadeiro envolvendo Vicência. Defronte da casa de meu pai morava uma família tradicional, era da elite da cidade. O chefe da família fora deputado e prefeito, era figura carimbada dos vips da terrinha, enquanto nós éramos da massa. Graças a Deus. Bom, uma das filhas desse Vip deu à luz menino e colocaram o nome de George Washington. Foi uma festa, colocaram até no Serviço de Alto-Falantes e no jornalzinho da cidade. Pois bem, Vicência depois de alguns dias também deu à luz a um menino. E, pasmem, também deu a ele o nome de George Washington. Umlocuot gozador que anadava muito na nossa casa também colocou na difusora e fez uma notinha para o jornal. Fou um rebu danado. A filha do graúdo ficou ingnada, subiu nas tamancas, rodou a baiana e explodiu falando que aquilo era uma ousadia daquela negra, hije afrodescendente. Mas o menino já estava registrado e ficou com esse nome. No batizado do George Washington afrodescendente, o padre ainda quis dar um jeitinho de mudar o nome, mas Vicência sacou o registro do garoto e, então, foi feito o batizado e deve ter sido extraído o batistério. Houve até comemoração na casa dela, eu fui, umas caninhas com carne de sol, feijão verde, manteiga de garrafa e cantoria de viola. Só o "cheirim" do chiqueiro incomodava, mas bebendo a gente esquecia.O padrinho do menino foi o tal ocutor e a madrinha anoiva dele.

O tempo passou, mas não o mal-estar dos "nobres", eles nunca sssimilaram a ousadia de Vicência. E esta fazia tudo para piorar. E para tirar um sarro com os nobres era ajudada pelo compadre, o locutor, ele ensinou a ela como pronunciar bem pomposamente o nome do filho como fazia a nobre. O treino foi no muro lá de casa. Ela ficou perita em chamar o garoto quase gritanto: George U ó x i t o n, puxando muito pelo xis. Era uma graça, ela ficava tocaiando a chegada da nobre na casa do pai, quando esta chamavapelo filho, Vicência então gritava pelo dela: "George U ó x i t o n, pegue logo a lata da lavage e vamo simbora!". Do outro lado da rua ficava um clima de revolta. Isso durou muito tempo. Coisas de uma época. Vicência era umafiguraça. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 11/11/2015
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