A MARATONA

Eu sabia...desde o início eu sabia que ia ser mais difícil do que o Atlético ser campeão. Mas, brasileiro é assim, tem a alma calejada, tropeça mas não desiste. A primeira etapa - a do cadastramento - já tinha sido enervante, prenunciando um segundo tempo impróprio para cardíacos. Que fiz, então, dessa vez? Montei plantão diante do computador. Uma vigília permanente. Dia e noite. Eu e minha esposa, na base do revezamento. Na hora de ir ao banheiro, o outro assumia. Bateu sono? A mesma tática: duas horas na cama para cada um. E quando o desânimo ficava maior que a esperança, repetíamos o mantra das arquibancadas: “eu acredito, eu acredito...”

Para não atrapalhar a concentração, também foi necessário desligar o telefone, esse intruso doméstico. Adotamos, enfim, um regime fechado dentro da própria casa, sem direito a visita, a televisão, a banho de sol. Foco absoluto na tentativa de emitir a guia de pagamento do e-Social doméstico até o dia 06 de novembro. Se fosse na época do Sarney, o trocadilho já estaria pronto: “Tudo Pelo e-Social.” Mas estamos em época de pátria educadora, onde país rico é – vejam que descoberta! - país sem pobreza.

E foi assim, sem pobreza de espírito, que eu me lancei numa maratona digital: vai e vem, sobe e desce, marchas e contramarchas sem fim. Um Sísifo do computador. Toda vez que chegava no comando para imprimir a guia, a pedra escapava das mãos e rolava montanha abaixo. E lá vai o vovô – de novo, de novo e mil vezes de novo! - apanhar a pedra no sopé da montanha, cada vez mais íngreme, e subir com ela nos ombros, cada vez mais recurvados, consolando-se com os versos de Drummond: “no meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho.” Na verdade, uma pedreira.

Quando, já sem forças, concluí que se tratava de uma missão impossível, o árbitro da partida anunciou uma prorrogação até o dia 30. Ufa! Que alívio! Prisão domiciliar relaxada, já posso sair de casa e passear com meus netos. Ir ao parque de diversões. Tomar sorvete. Comer pipoca. Quem sabe, comprar os presentes de Natal?

O chato é que vou fazer tudo isso como se portasse uma tornozeleira eletrônica. Porque eu sei que, no final do mês, provavelmente voltarei à reclusão imposta pelo site do e-Social. Àquela tortura do sobe e desce, vai e vem, tentativa e erro, esperando...esperando Godot.

Mas, de um coisa eu tenho certeza: se o Galo conseguir pôr a mão na taça, eu também vou conseguir a emissão da guia.

Nisso eu acredito!

Pereirinha
Enviado por Pereirinha em 04/11/2015
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