Doce Janero

Doce Janeiro

Luís Cláudio Ragioto

Não me lembro bem por quê, aliás, memória nunca foi meu forte, mas estava em Curitiba. Era o ano de 1985. Acho que viajei com minha mãe em visita aos paren-tes que moravam lá. Bom, em segredo, eu tinha motivos suficientes para querer estar lá, e por isso, todo o resto é irrelevante.

Meus motivos eram longos cabelos claros, lisos, olhos castanhos claros, vivos ao extremo, um grande e delicioso sorriso, marcado pelos dentinhos da frente ligeira-mente tortos, um charme especial, que atendia pelo nome de Maria Regina. Ela foi a mulher que amei verdadeiramente por toda nossa existência. Não que não tenha amado outras, mas a ela entreguei meu coração completamente e com ela dividi mi-nha alma. Para completar, ela me deu dois filhos lindos.

De uma generosidade incomensurável, teimosa muitas vezes, tinha o dom de agregar pessoas para trabalhar com ela. Não importava o que fizesse, ela se dava bem. Professora de catequese na adolescência, líder nata, Contadora por formação e profissão, mas Professora por amor, deixou um legado que levará anos para ser esquecido.

Bom, vamos voltar ao ano de 1985.

Eu já tinha 16 anos, e ela completaria 15 em fevereiro. Estávamos em janeiro.

Já contei que era apaixonado por ela?? Não?? Bom, eu era. Não sabia, ainda, o que tudo aquilo significaria no futuro, mas a amava.

Amante da poesia de Mário Quintana e leitora ávida, havia escrito um caderno de poesias no ano anterior. Na verdade, Reuniu os mais belos poemas dos mais diver-sos poetas: Drummond, Quintana, Vinícius, Pessoa. Guardava aquele caderninho com muito carinho, afinal, era seu tesouro.

Enquanto ela era uma menina precoce, doce e inteligente, eu era um garoto bobão, presunçoso, metido. E confesso: galinha.

Mesmo assim, ela foi capaz de me amar.

Dia desses, minha filha encontrou esse caderno de poesias. Fiquei feliz, pois nem me lembrava dele. Ela o leu, adorou as poesias. Perguntou sobre ele. Aí, me mos-trou uma coisa que me deixou muito intrigado, porém, perfeitamente feliz. No cader-no, há muitos anos, ela havia escrito uma dedicatória:

“Luís Cláudio,

Que este caderno seja guardado com todo amor e carinho.

Que, cada vez que o ler, lembre-se de mim. De quem te quer muito.

Maria Regina.

04/01/1985.”

Uma ironia dessas que só encontramos em contos de fadas, ou nas esquinas e ocasos da vida, pois ela partiu para os Céus com toda serenidade 27 anos depois, no dia 04/01/2012.

Descanse em paz e que Deus a abençoe, meu primeiro amor.