O prazer de escrever.
Sem dúvidas o ato de escrever desperta prazer, mas gostaria de questionar, o emprego do vocábulo – prazer – para definir o sentir gerado pelo processo criativo. Falar de prazer remete a algo tão carnal, parodiando um compositor. Acredito que caberia aqui o uso do vocábulo catarse, pois este realmente seria o ideal para expressar esta liberação das emoções, ou tensões reprimidas. É um dilacerar-se, desnudar-se, mostrar-se vulnerável.
Outro ponto a ser questionado, é a ênfase no estado de alegria, êxtase que o ato de escrever pode gerar em quem o pratica. Acredito que deveria ser acompanhado de um manual do tipo bula de medicamento, pois senão é dada a noção de ser algo inocente, sem danos ao usuário. Na verdade o que ocorre é que o usuário desavisado se encanta com a capacidade criativa e passa a acreditar que tudo serão flores e não é bem assim.
O importante seria pontuar os prós e os contras: suas indicações e naturais contra-indicações, as precauções e advertências e eventos adversos, assim como a posologia e como agir em caso de superdosagem. Estaria sendo exagerada? Não vejo assim, pois se tivesse sido alertada não estaria hoje tão dependente deste processo.
As palavras viciam, as possibilidades infinitas que oferecem nos encantam. Começam a surgir em doses homeopáticas: uma palavra aqui, outra ali, uma frase, um pequeno texto. Surgem quase inocentes e de repente, estamos viciados e acabamos compulsivos. Tudo vira motivo para se sentar em frente a uma tela de computador, ou andar com um bloco e uma caneta ao lado, seja na bolsa, na mesa de cabeceira. Também tem as situações em que somos despertados do sono, como numa crise alucinatória, onde as palavras surgem em flashes em nossa mente e se não colocarmos tudo num papel, não temos tranqüilidade. Parece até algo mediúnico! Sopram em nossos ouvidos; passamos a ser instrumentos para materializarmos as mensagens. Não se é mais o mesmo depois que se entra neste estado.
Isso sem falar nas crises existenciais quando nos colocamos a escrever e não encontramos as palavras para expressem nosso sentir. E se questionassem se há cura para todos os sintomas? Não sei, nem sei se me submeteria a algum tratamento desintoxicante. Não saberia mais viver sem as palavras, sem essa possibilidade de expressão.
Enfim, a palavra é o “prozac” do escritor. São as drágeas do bem-estar. Aliás, vai uma palavra, aí?