Um dia

O dia ainda bocejava; tragédias, nascimentos e o comércio ainda ouviam o despertador; consumido, de fato, só o estampado nos jornais,

O padeiro revelava sua eficiência, enquanto o vigia já ocupava lugar no ponto do coletivo; o ladrão ajeitava tudo que lhe era alheiro, recém surrupiado, e .que acabara de trocar de dono; a sonolenta desmarcava o encontro com o trabalhador.

O bebê, quase que em conluio com o galo, chorava pedindo o leite, e o galo anunciando a chegada do leiteiro. Os semáforos piscavam lentamente, retardando o iniciar do dia, e o enfermeiro, afobado, percebeu que havia perdido o tempo do primeiro soro a ser aplicado.

A ressaca pedia água e um analgésico;o despertador não aceitava os “cinco minutos a mais” pedidos por aquele que deveria ter acordado há cinco minutos atrás.

Os alunos esperavam, ardentemente, que o professor não chegasse para a primeira aula, outros esperavam que o professor simplesmente não chegasse.

Hoje eu vou pedir o aumento; hoje eu vou lhe dizer que a amo; hoje eu vou começar o regime, aspirações transbordavam nas bolsas de todos. Se todas fossem realizadas, aquele seria o dia do Senhor.

Assim, tão de repente, planos, projetos, ações ganhavam consistência, o relógio era inexorável, e os homens protagonizavam o dia, faziam concreto o pedreiro e o suor nosso de cada DIA.

Quantos veriam o sol se cansar, e sair para jantar estrelas, quantos desarrumariam a cama, na noite, agora embrionária?

O dia, como uma ampulheta derramava a areia pelo gargalo, por onde só alguns passam, e o tempo virava o mundo, e a ampulheta, de cabeça para baixo, esperando que, amanhã, um novo dia começasse

Roberto Chaim
Enviado por Roberto Chaim em 19/10/2015
Reeditado em 19/10/2015
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