TEMPO DAS AGUAS

TEMPO DAS ÁGUAS

Lá se vai outubro adentro e nada das chuvas, algum desavisado irá me dizer: Mas choveu sim em Goiás! É, choveu uma chuva de 15 minutos, e nunca mais!

O que me preocupa é que a anos não vejo mais a divisão que era clara no meu tempo de criança. Existia o tempo da seca e o tempo das águas. Começávamos o mês de outubro com olhos pesquisando o céu em busca de nuvens promissoras e as vezes elas tardavam, não chovia nas primeiras semanas, era necessário uma ida até o cruzeiro da serra levando garrafas d'água para o infalível cerimonial, aguava-se a madeira seca que sugava sedenta as gotinhas e quando chegava de noite a gente ouvia o rebombar dos trovões distantes e um raio iluminava a escuridão. Dali a pouquinho a primeira chuva chegava com enorme barulho, era de dar medo, mãos tampavam os ouvidos por causa dos brincos, olhos fechados e na boca a jaculatória: "São Jerônimo e Santa Bárbara Virgem"! Mas apesar do pavor o coração ficava alegre, enfim chegara o tempo das águas. Agora seriam seis meses chuvosos, era garantido, poderia acontecer de vez em quando algum veranico, geralmente em janeiro, quando dez ou quinze dias de sol entremeavam ao período chuvoso. Eram dias de lavar as roupas enxovalhadas, de carpir as roças e de sair de casa pra resolver os assuntos pendentes... Dezembro chovia o mês todo, o Natal era molhado, em janeiro a cara do sol tinha que ser desenhada com o calcanhar na lama pelas crianças para ser apreciada... era o mês das enchentes, as águas corriam abundantes pelos riachos, os olhos d´água nasciam nos terreiros e nós, crianças que éramos, tínhamos a certeza de que a vida continuaria por que em abril começaria outro período de seca e aguardaríamos ansiosos o próximo outubro!

Dona Pretinha.

DONA PRETINHA
Enviado por DONA PRETINHA em 18/10/2015
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