Relhos e castigos

Sobre relhos e castigos através dos tempos

Primeiro o homem procurou dominar os animais. Na Bíblia está escrito que todo animal sobre a Terra o homem poderia dominar. E o homem devorou, domou, dominou e domesticou. Ainda devora e descarta as sobras. Devora enquanto come para alimentar o corpo, e descarta o que não lhe interessa: cascas, gorduras, peles e sobras. Descarta o que não alimenta seu estomago ou não alimenta seu cérebro. Cada um tem uma necessidade corporal e mental.

Gerações cresceram sob uma dominação dos pais. Um Senhor nos céus e um senhor na terra. Uma dominação tal como a dominação de um animal. Animais são dominados pela força e pelas astucias de seu caçador e seu criador, o seu dominador. Aquele animal que se oponha a ser capturado pode ser conduzido com relhos e chicotes até o local de sua prisão.

Os animais não possuem a inteligência e as estratégias do homem para criar armadilhas, jaulas e gaiolas. Uma armadilha para capturar, jaulas e gaiolas para manter presos. Um relho ou um chicote na mão para ameaçar. Animais enjaulados e engaiolados recebem água e comida como um ato de caridade. Por naquele momento se forem soltos, não teriam como obter alimento. Estão tão habituados a ficar presos, que não saberiam como sobreviver ao frio e a fome quando soltos. E homem por tanto tempo já habituado em manter animais presos, que vê a sua atitude de oferecer água e comida como um gesto de amor e caridade a um animal. Um animal que aos seus olhos é incapaz de promover sua própria sobrevivência. O homem responsável pelo cativeiro oferece a água e a comida que lhe apetecem, em seu tempo disponível e sua vaidade. Tirando a livre escolha de um animal livre, em escolher o que vai comer. Comer o que encontra e o que necessita, conforme o tempo e a natureza oferecem.

O homem criou cidades que não possuem matas e rios, que possam oferecer alimentos aos animais que andam soltos pelas ruas e praças. Vivem mendigando um resto de comida, e em busca de uma poça de água. E assim justifica novamente a prisão de animais. Muitos vendidos como escravos pessoais em pet shops. Nas cidades e muitos lares, os animais já podem obter status de membros da família por algum dono ou criador. Estes animais têm direito a abrigo e ração balanceada, que não desperdicem o tempo e o dinheiro do dono. Tal como alguns escravos eram escolhidos e faziam parte da casa grande. Escravos escolhidos por gestos e dentes. Tinham como tarefas cuidar da casa, e dos filhos dos senhores, donos de fazendas e escravos. Como os animais de pet shop devem fazer companhia para os filhos de seus criadores, e por algumas vezes vigiar uma casa, são escolhidos pelas suas roupagens, e o mostrar de dentes.

E na falta de animais para prender, o homem procurou prender o próprio homem. Com conceitos de tradição, de família e de propriedade, criou regras de comportamento. Com as regras de comportamento não cumpridas, podem correr o risco de serem capturados e presos, pela própria espécie. Enquanto presos em jaulas e gaiolas compatíveis com o tamanho e conceitos no padrão do animal homem, receberão água e comida, uma refeição padrão. Bem como a proteção de outros animais da mesma espécie.

A sociedade evolui, as regras são aprimoradas, e os castigos acompanham uma evolução. Deixam de ser corporais e passam a serem morais. A desmoralização de ser preso, julgado e condenado. Perder a liberdade que tomava dos animais. Ser preso e enjaulado como um animal. Aqui os relhos e os chicotes foram substituídos por armas de fogo e cassetete.

Os castigos mudam pelas ruas e mudam dentro de casa também. Do relho pode ter passado para o cinto ou o chinelo. O homem que andava a cavalo, o cavaleiro, tinha sempre um relho ao alcance das mãos. O homem mais civilizado, o cavalheiro, podia ter um cinto ou um chinelo ao alcance das mãos. Sob a égide do provedor de abrigo e alimento, todos devem obedecer a suas regras. Quem detém valores morais ou financeiros, podem deter aqueles que habitam uma casa. Os submetidos a este processo comem o que lhe oferecem, entre alimentos e conhecimentos.

A sociedade cresceu com o conceito dos mais velhos possuírem um saber e um conhecimento. E a prole seguia seus conceitos e conhecimentos. O núcleo social deixou de ser um grupo familiar, e foram criados os grupos nas ruas e nas escolas. Criaram-se grupos nas faculdades e universidades, e grupos profissionais. Profissionais se agrupam em sindicatos e associações, para proteger um espaço e um conhecimento. Com um conhecimento podem dominar outros grupos, e proteger seu próprio grupo. Manadas, enxames e cardumes com seus conhecimentos, protegem seus próprios grupos.

Hoje os grupos sociais encontram-se na internet. Grupos construíram um saber e um conhecimento, que ultrapassou as paredes de uma casa. E aquele provedor de uma casa ficou isolado entre quatro paredes, olhando para uma televisão, como uma janela para o mundo que não vê. Vitimando-se das próprias armadilhas e cativeiros.

Com o isolamento de pais e provedores continuou a sua interpretação de que possuem um saber e um conhecimento. E agora não podem oferecer aos filhos mais do que seus ideais e as suas ambições. Continuam como criadores de jaulas e gaiolas oferecendo água e comida. Não enxergam que uma nova alimentação é o conhecimento. E se não tiveram muito, não entenderão que outros podem querer mais. Não entendem nem mesmo onde é possível obter este conhecimento. Onde ele se disponibiliza e o que deve ser feito com ele. Como obter o conhecimento que encontra e o que necessitam, conforme o tempo e a natureza oferecem. Donos de

cativeiros oferecem uma ração básica de conhecimento, ficam cativos do próprio cativeiro.

Estarão sempre oferecendo o que podem. Oferecem e disponibilizam o que acham que podem disponibilizar. Oferecem o que entendem e o que enxergam. Achando ser mais que suficiente. Já que talvez nem isto pudessem alcançar.

Texto disponível em:

http://www.publikador.com/pets/maracaja/2014/10/relhos-e-castigos/

http://osabereseosabores.blogspot.com.br/2014/10/relhos-e-castigos.html

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Rio de Janeiro/RJ ─ 25/10/2014

Roberto Cardoso (Maracajá)
Enviado por Roberto Cardoso (Maracajá) em 15/10/2015
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