O paraiso de Edileuza( ou como perder o humor às sete horas)
Sete horas da manhã.
Dona Edileuza saltou do ônibus. Sete horas da manhã.Ela já está exausta. Lança um olhar irônico para o nome da empresa de ônibus – Maravilha – coletivo sujo, apertado, caindo aos pedaços. O segundo tumbeiro que ela é obrigada a pegar no mesmo dia. Começa a subir a passarela para ser triturada do outro lado da pista.
Ela sobe a passarela como quem escala uma montanha cenozóica, flutuando em um misto de sono atrasado e sonho: a bela Cordilheira dos Andes, o lago Titicaca, Cuzco, Machu Pichu, o trenzinho turístico...Deuses!!!Como ela deseja sumir. Sumir e ser teletransportada ao Peru. Sim, teletransportada, pois se depender do preço da passagem aérea pela Taca, que está pela hora da morte, ela não vai conseguir chegar nem ao Acre.
A ciática garfa-lhe uma pontada de dor que percorre toda a parte superior da perna até o dedo mínimo do pé direito. Ela geme, estaca no meio da passarela, e as lindas paisagens do Peru transformam-se, à sua frente, da esquerda para a direita, em um posto de gasolina, uma lanchonete de beira de estrada,uma poça d´água pavorosa e a escola com muro roxo batata. “Nada como um choque de realidade para começar bem o dia.” Passar por aquele muro roxo batata e dar aulas até o meio-dia. “Deuses do Olimpo, não seria preferível tentar pular o Muro de Berlim e ser fuzilada? Não, o muro de Berlim não, já derrubaram, é melhor tentar aquele outro ...o Muro da Cisjordânia, em Israel.” Pensa que da maneira como as coisas andam, talvez fosse fuzilada na própria escola, pela diretora, fumante inveterada, que vive desviando verba da escola junto com fornecedores de merenda e pensa que ela, junto com a professora de Artes a denunciou na inspetoria de educação.Ou quem sabe poderia ser liquidada por algum aluno que brigara com a namorada no dia anterior.
Pensa no Gustavo, seu antigo namorado. “Mas isso lá são horas de pensar no Tavinho, meu Deus do céu!” Precisa continuar caminhando para o Gólgota. “Ai, o Tavinho beijava bem demais. Que desperdício! Numa quinta-feira à noite, descobriu que ele era gay. O pai do Tavinho dizia que só podia ter sido por influência daquele primo dele, um tal de Bruninho, que morava ... morava onde mesmo? Naquela cidade onde descobriram petróleo e vai ser governada por um sheik árabe...Itaguaí..não..Itaocara..não...Ah! Lembrei:Itaboraí!”
Sente vontade de sentar na passarela e ficar ali, parada, sem fazer nada.Chega ao final da passarela com o sinal de entrada da escola arrebentando seus últimos neurônios.No portão de ferro enferrujado, plantado como um dois de paus, o porteiro da escola, faz menção de fechar a entrada. Ela apressa o passo, enfia o pé na poça d’água, ultrapassa o portão do Gulag e a diretora joga-lhe uma baforada de cigarro na cara dizendo: “Bom dia, madame!”