Flores

Meu avô paterno, após uma vida que fervilhava entre forrós e copos enormes de cerveja, entrou em depressão.

Sua resposta para um ‘’tudo bem?’’ já era muito mais que previsível. Ele fazia uma careta, olhava para baixo, e, tomando fôlego, dava início a uma verborreia de lamentações: dores ali, dores aqui, porque a morte não me leva?

A sua casa também não ajudava: tinha um aspecto pesado no ar, como se algo ruim estivesse para acontecer. Os cômodos eram escuros e mórbidos. Meu avô costumava passar o dia todo em seu quarto, deitado desconsoladamente em uma cama de solteiro, circundado por uns cinco maços de cigarro barato. E pela fumaça deles, que mais parecia uma névoa.

Então, meus tios e tias, em busca de ajuda, conseguiram arrastá-lo para um médico que o receitou alguns antidepressivos: sua melhora foi visível e logo, incrivelmente, ele estava indo dançar seus forrós aos sábados.

Mas a ironia o deu um pontapé: O remédio continha um efeito colateral de mania, que o fez ficar viciado em comprar flores. Muitas flores.

Pela primeira vez que entrei na casa, e me deparei com uns cinco vasos coloridos apenas na entrada, achei que havia me perdido e errado o endereço.

Então, minha tia me contou durante o café que ele havia comprado trinta vasos – trinta! Inclusive, ele até machucou a coluna de tanto arrastar os pesados vasos para lá e para cá.

Era quase inacreditável: Como um homem amargo decide sacrificar seu dinheiro – e sua saúde – por meras margaridas?

Bom, havia um porém em relação às flores: Elas eram de plástico, horripilantes. Ao estilo daquelas encontradas na cabeceira dos túmulos.

Isso acabou piorando o aspecto da casa: passou de desagradável para assustador – apesar da gama de cores ter aumentado.

Fiquei matutando comigo: As flores espantavam a tristeza ou atraíam a Morte, moradora de cemitérios e hospitais?

Será que ela gosta de flores?

Estaria meu avô tentando chama-la ou tentando espantá-la?

Bom, não há problema. Provavelmente, Dona Morte não aguentaria a verborreia de meu avô e iria embora. Ou talvez, sentindo-se em casa, sentaria à mesa do café e contaria suas próprias histórias.