Endomingar-se
Domingo é chato, mesmo: não importa se dia santo ou dia de ressaca.
No meu caso, nesse dia específico, deixo de ser humana: estou mais para rocha ou fungo; nem pareço ter vida.
É meu dia de descansar que, na verdade, acaba me cansando.
Recuso-me a fazer algo mais complexo que escovar os dentes ou respirar. Tirar o pijama infante já foi esforço demais.
O meu domingo sempre vem com uma sensação onírica de chatice, tédio, que me atinge juntamente com meu reflexo – meu rosto matinal (ou não tão matinal), sem resquício de maquiagem ou de esforço. Tem até trilha sonora... Som de ponteiros de relógio, que, no domingo, estão sempre lentos demais, rastejando.
Se você possui uma família tipicamente italiana, me entende: Domingo é dia de macarronada na casa da avó que, aliás, fala graciosamente alto demais.
No caminho, eu vou vasculhando o céu melancolicamente azul; percebo que até as nuvens odeiam o domingo: nem dão as caras.
Atravesso a rua e entro no quintal. Consigo ouvir meu avô cantando seu sertanejo romântico de longe...
Minha avó está encostada no sofá, com agulhas de crochê nas mãos que compunham alguma arte de cor cinza-claro. Um sorriso e um ''seu cabelo está oleoso'' vêm de encontro.
Sinto que o domingo é o sábado dos sentimentos. Eles somem e voltam apenas de madrugada, desgastados. Só o tédio fica, sentado numa poltrona, com um gato gordo no colo, assistindo golfe.
Entendo que mais da metade da população malquer a segunda-feira.
Porém, ainda acho que ela é a amiga ingênua do domingo, que acabou desafiando-a a atormentar as pessoas. Tenham misericórdia.
Na verdade, confesso que metade do problema semanal que tenho diz respeito à casa da minha avó. O sofá é duro demais e os canais são todos maçantes. É uma escolha: ou você assiste “Esquenta” ou tenta suportar a risada postiça do Celso Portiolli.
Você acaba parecendo o tédio em si. Só falta o gato amarelo.
Meu avô também deve abominar o domingo: Por pouco não me ultrapassa no quesito de quase se tornar um objeto da sala. Ele senta na sua poltrona e vai inclinando sua cabeça para trás até dormir: É admirável.
O domingo é tão injusto comigo... Transforma meus textos em manequins amputados jogados num canto qualquer. Nenhum poema decente quer nascer num domingo. Poxa, domingo, pare de afugentar meus filhinhos!
Se bem que...
O domingo é uma adolescente chata de cabelo oleoso escrevendo uma crônica sobre o domingo num domingo. Que não consegue confessar que existe uma única coisa boa no domingo: A macarronada.