EMBATE ÉPICO ATEMPORAL DA HONRA CONTRA A VILEZA
Há herois e também há super-herois, classificações bastante distintas. Da classe dos super-herois não consigo nesse momento lembrar-me de nenhum sequer que não lance mão de uma roupa inusitada e de uma máscara.
E para todo super-heroi, há um vilão. Há casos em que para cada episódio de uma “estória” dum mesmo super-heroi, há um super-vilão diferente. Daí, concluímos que não há super-heroi sem super-vilão. Ambos se completam, por isso o super-heroi nunca mata o vilão, pois se assim o fizer destroi a si mesmo. É bem verdade que os super-vilões também lançam mão de roupas inusitadas e máscaras.
É como se o super-heroi fosse a outra face do vilão e, por conseguinte, o vilão a outra face do super-heroi. Duas naturezas de um mesmo ser digladiando-se. E nessa rinha não há vencedor por excelência. Digo que não há vencedor por excelência porque ainda que pareça que o super-heroi venceu o vilão, este ressurgirá mais rústico e com novos estratagemas.
Um verdadeiro embate épico atemporal da honra contra a vileza.
Da mesma maneira como não me recordo de nenhum super-heroi ou super-vilão que não use máscara, também não conheço nenhuma pessoa, nenhum ser humano que não lance mão de uma máscara, ainda que seja a mais simples possível, tal qual a usada pelo Zorro, embora este não pertença a classe dos super-herois.
As máscaras usadas por nós humanos, nada mais são do que a tentativa de aplacar ou, em alguns casos, de dissimular as nossas vilezas, os nossos vitupérios, as nossas ignomínias; quer sejam perpetrados em público quer sejam em particular.
Quanto aos nossos atos públicos de honradez, de hombridade, de proeminência, não fazemos muito caso de velar-nos com máscaras, pois queremos receber louvores de outros seres que, no momento do nosso heroísmo praticado, são meros espectadores. E por que não dizer também expectadores, visto que com certa dose de insídia, ficam eles na expectativa para ver nossa atitude, a fim de julgar-nos como herói ou como vilão?
Em um movimento quase que dialético, no qual não conheceríamos o dia sem a noite, o amor sem o ódio; não conheceríamos também a bela face da honradez se não conhecêssemos a vil, “vil no sentido mesquinho e infame” face da vileza. Não sei ao certo se posso chamar isso tudo de dialética. Mas isso não é o que importa. O que importa-me em minhas lucubrações é afirmar que não há ser humano por mais honrado que seja nunca tenho sido vil, é afirmar que não há ser humano que por mais amoroso que seja nunca tenha odiado, é afirmar que não há ser humano por mais fiel que seja nunca tenha traído.
A contrário sensu, não há ser humano que por mais vil que seja nunca tenha sido honrado, não há ser humano que por mais odioso que seja nuca tenha sido amoroso, não há ser humano que por mais traidor que seja nunca tenha sido fiel.
Há uma frase de impacto sobre natural que me impressiona todas às vezes que reflito sobre ela. Esta frase veementemente afirmativa, encontra-se no Livro do Profeta Jeremias: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?”. Tal asserto lança por terra qualquer tentativa na crença de que exista por aí uma “pessoa humana” completamente honrada. Debalde se esforçará o homem em buscar dentro de si mesmo um ser semidivino.
“Desesperadamente corrupto”. Nossa! Quão frustrante é essa frase nominal! Mas... assim vamos levando a vida, num eterno embate entre honra e vileza. E assim as pessoas vão passando pelas nossas vidas, como quem passa por sobre um terreno que fora aterrado com detritos, resíduos, entulhos, e que no final recebe uma camada de porcelana, sem que essas pessoas se apercebam, no entanto, do que há por baixo da bela porcelana que nos reveste.