CONSTATAÇÃO
Inexplicavelmente a dor diminuía, dia após dia, ao ponto de não incomodá-la mais.
Degararinho as tarefas simples do dia-a-dia voltavam a lhe dar prazer. A vida começava a ganhar cor, depois de um longo, tenebroso e doloroso inverno.
Aquele sentimento inquietante já não ocupava o centro do seu coração, talvez outros lugares menos nobres. Talvez...
O furacão violento de sentimentos transformara-se em vento leve, brisa suave... Quase imperceptível!
O desejo avassalador e intrépido acalmara-se, moldando-se a letargia da indiferença dele.
Ao olhar para o relógio surpreendera-se... A angústia da espera terminara, e o tempo agora passava sem pressa alguma, calmo, como uma folha livre no remanso do riacho.
Descobrira também que não precisava mais da aprovação e da aceitação dele. Era ela própria, única dona da sua vida, de seus desejos, e até mesmo de suas falhas.
Percebera que uma luz azul bem clara emana de seu próprio interior. Com essa luz vinham emanações miraculosas de magia, de poesia e vida. Durante tanto tempo não percebera que era essa luz o motor propulsor de sua força, o estímulo que impulsionava seu destino.
Num reflexo de lucidez descobrira ela pisando em terra firme...
Por um momento teve medo, pois uma situação nova se desenhava em seu horizonte.
Enxugou o fiozinho de lágrima que timidamente escorria pelo cantinho dos seus olhos, e olhou para traz tentando se agarrar a qualquer vestígio do passado, mas o que enxergou deixou-a extremamente assustada.
Uma turva neblina tingia o céu de negro, engolira tudo que tinha ficado pra traz... Deixando apenas um vazio. Um vazio que não doía, não pesava. Sentia como se finalmente tivesse se libertado de um grande peso.
Apesar do sobressalto, sabia ela que há muito vislumbrava tal cenário, e intuitivamente pressentia que não havia mais possibilidade alguma de voltar atrás.
(Edna Frigato)