SOBRA DE VIDA
A chuva é insistente, ela não para um instante sequer de inundar a terra outrora ressequida, sequiosa de água, de vida e de frescor...
Mesmo assim, com toda essa chuva que cai, o dia está triste... arrasta essa tristeza há alguns dias, desde quando o tempo esfriou...
Podemos manter felicidade em tempo igual a este? Claro que podemos, tanto podemos que, mesmo em tempos outros, de calor e muito amor, em plena alegria de sermos felizes, a parcela de tristeza nos visita. Faz parte da vida de cada um de nós a alegria e a preocupação...
E a chuva continua dominando o mundo... e o frio aumenta e aumenta a solidão da gente...
A realidade fremente, fica somente para nos atormentar e as verdades de outrora retornam, e criam vida, e criam momentos que seria bom nem recordar...
É triste saber que um dia amei de verdade, por pura maldade você nem sentia meu desejo vibrante no corpo a arder. Você se afastou, se foi e fiquei sem te ver nunca mais, sem ouvir tua voz, sem vez teu olhar, jamais... O fim do amor é muito mais triste que o nosso final restante.
Dia de chuva, dia de tristeza, o mundo que chora, o amor que não vem, nem acena um minuto sequer... mesmo assim, neste ambiente frio, de pouca luz, entre escolher o mundo e o amor, o mais certo é escolher o amor porque com ele conquistaremos o mundo quer faça frio, quer faça calor...
O dia de hoje fiz um trato com a minha tristeza e vou dedicar todo o meu tempo para atualizar todos os choros que ainda não tive tempo de chorar em outras horas, muito embora, tenha chorado também...
Meditando sobre o fato da tristeza invadir meu domínio, neste domingo de hoje, constatei que a felicidade é coisa estranha e passageira, dolorosa e traiçoeira, deixando um rastro de tristeza em nossa vida depois que os anos, as horas, a plena felicidade passam, restando-nos somente um tempo vazio, despovoado, dura prova!
Fico triste, nesta chuva, o dia inteiro! Não sou segundo, não sou terceiro, não sou primeiro a ficar triste neste outeiro à beira mar... Quero tanto ficar sem ninguém, sem amor, sem um bem, mas ao mesmo tempo sempre procuro escutar uma voz me dizer: "como vai o seu dia?".
A tristeza deste dia em seu harmônico proceder, se manifesta em toda plenitude, mostra as suas manguinhas, lança sobre mim a sua ironia necessária. É uma realidade sádica, onde, até mesmo por pura maldade, coloca toda a bondade sobre a mesa. E haja mais sofre, e haja recordar que fomos felizes! É um humor negro que nem respeita os argumentos sensatos do pensamento, que mesmo nesta desdenhosa esfera jamais atingisse este nosso singelo e pueril aflorar pela vida e pelas coisas boas que existem...
Mas a vida é mesmo assim: uns dias cheios de tédio e sem remédio para sarar, enervante e sem fulgor. Dias outros, lânguidos e primaveris em plena luz do sol, deixando-se envolver pelos mais simples acontecimentos, encontrando poesia em uma folha que cai, um regato de água límpida e suave que transporta a vida dos peixes a nadar, uma criança que corre inebriada atrás de uma borboleta... E, se não me atentar ao fato que depois de tanta tristeza, o coração pode explodir por causa de tamanha felicidade! E vida que segue, com a face da alegria, ficarei mais ajustado, sem o menor pejo, exclamarei: “vem do bem-estar que sinto!"
Hoje, nada disto existe, só tristeza, somente frio e muito sono para dormir...
Amanhã, quem sabe? Muita estrela brilhará no céu, assim promete o meu pensar em meio a muita tristeza, na longa espera de uma voz escutar e me saudar com deslavada alegria: bom dia Carlos!
Carlos Lira
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