A PRISÃO DA NOTA DE CINQUEMTA MIL RÉIS

Era no tempo do ronca. Canaã ainda era distrito. Só havia uma casa comercial: uma bodega, uma casa que servia de pensão, várias casinhas acanhadas, uma espécie de galpão que serv ia de cadeia e, no final do arruado, fica o popular "Pinga-Pús", uma espécie de ziona.

A bodega era de propriedade de Seu Moacir, um velho meio ingênuo, semianalfabeto que falava muito errado mas que era muito respeitado no lugar. O nome da bodega era "A Furna da Onça", e isso se deveu a uma história que Seu Moacir contava sobre uma caçada a auma onça malhada, talvez a única mentira que contara na vida.

Sobre a Furna houve um causo que as pessoas nunca esqueceram, mesmo depois de décadas, e que envolveu o proprietário e seu melhor amigo, Seu Nicolau, um caboclo que tinha uma fazendola na Região, criava algumas vacas leiteiras e sua tgerra tinha muitas fruteiras e água em abundância. Esse cidadão só aparecia na bodega no dia da feira, era muito calado e carrancudo. E valente, tinha lutado contra Lampião e seus cabras. Ele praticamente ganhara a fazendola de presente do coronel Duarte Pedrosa quando este foi embora para o Rio de Janeiro e vendeu todas as suas terras, mas reservou esse pedaço de terra, privilegiado, para seu empregado de confiança, Seu Nicolau. Mas não deu de graça não, porque assim o empregado não aceitaria, fez um preço faz-de-conta.

Bem, num dia de feira, o chefe político da Região, o coronel Nepomuceno, resolveu visitar Canaã, e quando chegou na pensão e futucou nos bolsos, deu pela falta de uma nota de cinquenta mil réis. Ficou enraivecido e certo que tinha sido roubado. Na hora, que nem caldo de cana, foi ao único estabelecimentocomercial do distrito, a bodega, e ordenou a Seu Moacir que se aparecesse alguém com uma nota de cinquenta mil réis prendesse a nota, e avisasse ao cabo de políicia que servia de delegado do arruado, que a nota havia sido roubada dele.

Logo depois que o coronel saiu, a bodega cheia, entrou Seu Nicolau, cumprimentou o comerciante e pediu ode sempre: café, açúcar, feijão, sabão, farinha, sal, um pedaço de charque e uma garrafa de cana. Perguntou o valor das compras,e então retirou do bornal uma nota de cionquenta mil réis, entregou-a ao proprietário. Seu Moacir esbugalhou os olhos, ficou nervoso, mas anão podia deixar de cumprir uma ordem do chefe político, não era doido, então fitando o amigo nos olhos disse: "Meu prezado, essa nota tá presa pruquê é do coroné Nepomuceno, ele disse qui foi robadae mandô prendê a nota. Vô avisá o cabo pra você si isplicá cum ele. Fiqui aqui que já vorto já". Seu Nicolau era um sujeito explosivo, mas sabia que o amigo era muito ingênuo e temia demais o coronel, aí resolveu pregar uma peça nele,meteu a mão no bornal e retirou dele mais três notas de cinquenta mil réis, dizendo alto para todos ouvirem: Será possível que nessa terra não tem quem possua uma nota de cinquenta mil réis, só coronel?!!! Olhe, Seu Moacir, passou uma nota, prenda mais esta nota,, e esta, e esta, devem ter sidotodas roubadas do coronel".

O pobre homem completamente aturdido e arrependido, entendera que fizera uma injustiça, começou a chorar envergonhadoe disse: "Pelo amor de Deus,meu amigo mi adiscurpi, eu sô mermo uma topêra, um tapado.Guardi o seu dinheiro todo, e levi as mercadoria de graça. Me adiscurpi meu amigo",

E arriou num tamborete, as lágrimas escorrendo pelo rosto. Os dois não deixaram de ser amigos, inclusive o coronel achou a sua nota na bagagem, foi na biodega e comunicou o fato. Mas Seu Nicolau apenas para brincar copm Seu Moacir todas as vezes que vinha a sua bodega dizia rindo: "Seu Moacir, se aparecer uma nota de cinquenta mil rpéis é para prendê-la porque foi roubada do coronel Nepomuceno".

O velho ria, mas aquela recordação o envergonhava.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 09/09/2015
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