A Arte de não esperar demais

Não esperava nada da noite de ontem além da certeza de uma ressaca moral. É o que sempre acontece quando ouço o conselho da Beyoncè, ponho aquele vestido de arrasar e saio com as amigas sem pressa e sem planos. Elas chegaram. Todas estão lindas. Sabemos que nessa hora a mulher analisa mentalmente quem fará mais sucesso, principalmente com outras mulheres, já que agradar superficialmente a um homem não é das tarefas mais difíceis. De verdade, somos um grupo muito interessante, diferentes em suas proporções e personalidades. Estamos solteiras e a saída de hoje a noite não representa uma caçada, ao menos, intencional. No caminho, música alta pra entrar no clima, cinto de segurança, porque também somos prudentes, uma bebida pra animar e veja só, a sorte é tão companheira que uniu cinco mulheres e uma delas não bebe, o que a fez ganhar o título de motorista da vez, de todas as vezes. Chegamos. Somos notadas e notamos. Nada excepcional, apenas homens olhando para mulheres e as imaginando sem roupa, as expressões de tara denunciavam isso. Está tocando a minha música, o que me soa como um convite à pista. Não recuso. Num instante todas se separam, talvez sejam as diferenças, funcionamos bem juntas, mas em algum momento precisamos do espaço e sempre soubemos identificar isso. A música termina, procuro algo pra beber e no caminho vejo uma delas conversando com um cara, duas estão no bar e a outra dança com uma menina. Sinto alguém puxando o meu braço, olho, não gosto e me esquivo. Ás vezes o simples trajeto até o bar torna-se uma prova de corrida com obstáculos, dos mais variados, alguns até agradáveis, o que não era o caso nesse dia. Elas me esperam com uma bebida, dizem alguma coisa que não entendo - nunca entendo nada quando a música está muito alta, mas finjo. Volto pra pista, dessa vez acompanhada por elas. A conversa com o carinha evoluiu para um beijo intenso, a dança com a garota tornou-se uma pegação frenética, a bebida começa a fazer efeito, a música fica ainda melhor. Troco olhares, alguns promissores, mas sou do tipo que demonstra, eu deixo que entendam que a aproximação é permitida, só não garanto a permanência. Mais música, mais dança, mais bebida, olhares, investidas, um beijo - bom -, mas não passa disso, não vejo as garotas mas sabemos que o ponto de encontro no fim da festa é sempre o bar, certamente a noite delas deve estar mais produtiva que a minha. Hora de ir. O corpo avisa. Bebo enquanto as espero, afinal seria um desperdício não o fazer estando num bar. Aos poucos elas chegam. Uma, duas, três... falta alguém, a peça fundamental que nos levará pra casa em segurança, a única que não pôs uma gota de álcool na boca, mas beijou muito uma morena lindíssima. Manda uma mensagem dizendo que a noite irá se prolongar na casa da sua nova amiga. Bom pra ela. Precisamos de um táxi e meia hora depois, conseguimos, um charmoso rapaz cedeu sua vez para nós, disse que a única condição seria ter o meu número. Olhando mais atentamente vi que se tratava do cara do beijo bom que saiu pra pegar uma bebida e perdi de vista. Não vou sofrer se ele não ligar, mas gostaria que ligasse. Apenas uma de nós teria um orgasmo aquela noite, ainda assim, voltamos pra casa da mesma forma que saímos, felizes, solteiras e sem expectativas. Planejar cada passo é tentar criar um roteiro perfeito e isso não funciona na vida real. Não na nossa vida onde as histórias de amor duram mais que 1 hora e 45 minutos, onde não somos a Angelina Jolie, temos celulites, estrias e rugas, o príncipe não é encantado, nem é o Brad Pitt e o final feliz nunca é garantido. Deixa a perfeição pro cinema.