Quem Tem Medo da Correia do Padre?
A metrificação do tempo é uma produção humana. Se o homem inventou a maneira de medir esta grandeza, ela, o tempo, cria o seu homem. A humanidade é filha de Cronos. Reproduzimos, carregamos e marcamos o tempo no qual vivemos.
A Barbacena pós-moderna dista da Barbacena provincial, monárquica e romântica que foi, que existiu. Para conhecê-la basta ler a produção escrita pelos homens que nela viveram. Entre estas produções estão a literatura produzida por José Joaquim Correia de Almeida. Ele tornou-se padre. Além de padre tornou-se mestre lecionando em colégio público, particular e em casa. Foi professor de latim, francês e música. Além de professor foi poeta satírico criticando figuras públicas e tudo aquilo que para ele era verdade intocável: o catolicismo e a monarquia. Nasceu em 1820 e foi para o além em 1905.
A correia, além do sobrenome, era sua Poesia.
Aquilo que o contrariava era castigado por sua sátira poética. Sua língua também era um chicote quando se tratava de política:
A metrificação do tempo é uma produção humana. Se o homem inventou a maneira de medir esta grandeza, ela, o tempo, cria o seu homem. A humanidade é filha de Cronos. Reproduzimos, carregamos e marcamos o tempo no qual vivemos.
A Barbacena pós-moderna dista da Barbacena provincial, monárquica e romântica que foi, que existiu. Para conhecê-la basta ler a produção escrita pelos homens que nela viveram. Entre estas produções estão a literatura produzida por José Joaquim Correia de Almeida. Ele tornou-se padre. Além de padre tornou-se mestre lecionando em colégio público, particular e em casa. Foi professor de latim, francês e música. Além de professor foi poeta satírico criticando figuras públicas e tudo aquilo que para ele era verdade intocável: o catolicismo e a monarquia. Nasceu em 1820 e foi para o além em 1905.
A correia, além do sobrenome, era sua Poesia.
Aquilo que o contrariava era castigado por sua sátira poética. Sua língua também era um chicote quando se tratava de política:
“Por ter chamado um fiscal eleitoral pejorativamente de ‘espoleta’ ( “cabo eleitoral” ), Correia de Almeida foi, em Barbacena, condenado a quatro meses de prisão, pena posteriormente, comutada por D. Pedro II, em decreto..."* (p 246)
Correia de Almeida era contrário ao Positivismo e, por extensão, à República. E como tal publicou a obra “A República dos Tolos” ao ver que a forma e o sistema de governo na qual acreditava – a monarquia – estava sendo questionada pelos Positivistas que levariam à proclamação da República.
Como a República Positivista elegeu seus “heróis” para se firmar e justificar, até seu protomártir não escapou de seu chicote poético:
Tira – Dentes
Infame era outrora sanguenta mortalha
do herói Tiradentes, mineiro leal:
mas hoje é um emblema de insigne medalha
da grei que se ufana de ser liberal. (p.30)
Infame era outrora sanguenta mortalha
do herói Tiradentes, mineiro leal:
mas hoje é um emblema de insigne medalha
da grei que se ufana de ser liberal. (p.30)
Como monarquista que era seus amigos preferidos eram da nobreza. Em Barbacena o padre era dileto do Conde de Prados. Quando na praça próxima à residência deste nobre elegeram uma estátua alegórica à Liberdade o padre não deixou por menos:
Na praça do doutor Conde de Prados
sobre esguia coluna empunha um facho
estátua de mulher com rosto macho
incentivo de vivas e brados! ( p. 36)
sobre esguia coluna empunha um facho
estátua de mulher com rosto macho
incentivo de vivas e brados! ( p. 36)
Educado em ambiente masculino e atuando sempre com a masculinidade, quer seja no seminário ou nas turmas de rapazes para quem lecionava, não poupava críticas às mulheres por ser o misógino que era.
Se quatrocentas maritacas
no pinheiro estão pousadas,
uma só voz não destacas
das vozes destemperadas.
........................................
Meia dúzia de mulheres,
reunidas numa sala,
escuta-as tu, se o puderes,
pois nenhuma então se cala.
Sérios leitores não pensem,
que da hipérbole se abusa:
as maritacas não vencem
na gritaria confusa. ( p.55)
no pinheiro estão pousadas,
uma só voz não destacas
das vozes destemperadas.
........................................
Meia dúzia de mulheres,
reunidas numa sala,
escuta-as tu, se o puderes,
pois nenhuma então se cala.
Sérios leitores não pensem,
que da hipérbole se abusa:
as maritacas não vencem
na gritaria confusa. ( p.55)
Com a República instalada era necessário refazer as mentalidades. Estas são produzidas e reproduzidas pela instituição que forma através da pedagogia as novas gerações. Os súditos da Monarquia precisavam ser transformados em cidadãos da República – com licença da redundância. Para isto foram criados os Cursos para normalistas, moças normatizadas para imprimirem as normas do novo governo republicano. Antes o ensino era predominantemente ministrado por homens formados nos seminários. Agora seria responsabilidade daquelas incumbidas pelo poder público de normatizar cidadãos. As Escolas Normais proliferaram para habilitar as moças promoverem a Educação do Estado.
Antirrepublicano, antipositivista, monarquista, o mestre padre se viu com o seu orgulho ferido. Por isto mais uma vez a sua correia zuniu através de sua pena tinteira:
Nossas Aulas Normais
No imenso Estado de Minas
escolas normais pululam!
Tão instrutivas e finas
não são petas que se engulam.
São verdades verdadeiras,
que, entrando por um ouvido,
não serão as derradeiras,
que pelo outro tenham sido.
Não se estuda (nem convinha)
o rançoso catecismo;
não se reza ladainha,
horror do catolicismo.
Porém muito aí se aprende,
em compêndios complicados;
se o que se lê não se entende,
colher-se-ão bons resultados.
É a química estudada,
desde a tona até ao fundo;
e a explicação é fundada
nas moléculas do mundo.
Sem que se falte à verdade,
sem que o público se iluda,
reconhecer quem não há de
que a mecânica se estuda?
Um escolar, de relance,
do argueiro faz um colosso,
ainda que não alcance
decorar o ‘Padre Nosso’.
É dever de um sábio lente
ensinar biologia,
e, por não ser indolente,
praticar pedagogia.
E o aluno recebendo
a lição do pedagogo,
ao menos fica sabendo
que o defluxo não é gogo.
Se grã vantagem se colhe
de nossas normais escolas,
só o tolo ombro encolhe,
e vai dizendo – ‘ora bolas’.
Mas uma coisa eu estranho,
nem o digo por acinte!
Aprecie-se o tamanho
do fenômeno seguinte:
Normalizam-se dezenas
de raparigas capazes,
e, quando muito, um apenas
se habilita entre os rapazes!
Se continuar destarte
e paradeiro não acha,
a instrução, que se reparte,
é mais fêmea do que macho. ( p.150)
No imenso Estado de Minas
escolas normais pululam!
Tão instrutivas e finas
não são petas que se engulam.
São verdades verdadeiras,
que, entrando por um ouvido,
não serão as derradeiras,
que pelo outro tenham sido.
Não se estuda (nem convinha)
o rançoso catecismo;
não se reza ladainha,
horror do catolicismo.
Porém muito aí se aprende,
em compêndios complicados;
se o que se lê não se entende,
colher-se-ão bons resultados.
É a química estudada,
desde a tona até ao fundo;
e a explicação é fundada
nas moléculas do mundo.
Sem que se falte à verdade,
sem que o público se iluda,
reconhecer quem não há de
que a mecânica se estuda?
Um escolar, de relance,
do argueiro faz um colosso,
ainda que não alcance
decorar o ‘Padre Nosso’.
É dever de um sábio lente
ensinar biologia,
e, por não ser indolente,
praticar pedagogia.
E o aluno recebendo
a lição do pedagogo,
ao menos fica sabendo
que o defluxo não é gogo.
Se grã vantagem se colhe
de nossas normais escolas,
só o tolo ombro encolhe,
e vai dizendo – ‘ora bolas’.
Mas uma coisa eu estranho,
nem o digo por acinte!
Aprecie-se o tamanho
do fenômeno seguinte:
Normalizam-se dezenas
de raparigas capazes,
e, quando muito, um apenas
se habilita entre os rapazes!
Se continuar destarte
e paradeiro não acha,
a instrução, que se reparte,
é mais fêmea do que macho. ( p.150)
Se a Monarquia tinha suas correias para impor práticas católicas, a República teria suas palmatórias para recalcar os heróis nacionais. A cada forma de governo suas pedagogias e seus emissores.
*Texto produzido com base no livro, cujas páginas são citadas:
FONSECA, L. M. A. (Org.) . Padre Correia de Almeida - Notícias do Padre Correia de Almeida nos Jornais de Barbacena - Período 1881-1905. Centro Gráfico e Editora Ltda, 2003.
*Texto produzido com base no livro, cujas páginas são citadas:
FONSECA, L. M. A. (Org.) . Padre Correia de Almeida - Notícias do Padre Correia de Almeida nos Jornais de Barbacena - Período 1881-1905. Centro Gráfico e Editora Ltda, 2003.
Leonardo Lisbôa
Barbacena, 10/08/2015
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conversandocomoautor@gmail.com