FUGA PELO OLHOS

Passei pela sala que nem deu tempo dela reclamar suas dores no corpo e cansaço. Ela notou, é claro, e foi atrás. Mas a conhecendo bem como conheço, sabia que as próximas palavras seriam ásperas e secas como só ela sabe ser quando não sabe lidar com o que lhe preocupa. Iria me dizer que choro atoa e não sei dizer o que me incomoda.

Pensei em puxar um assunto rápido antes de qualquer palavra e falar sobre como gastei tanto inconsciente com meus sonhos malucos na última noite. Talvez falar sobre a falta de chuva e a poeira destes dias. Mas não deu tempo. Ela me olhou de frente e não sei disfarçar. É complicado lidar de forma madura com todos os “nãos” quando se esperou muito pelos “sins”. Firmei meu olhar fazendo-a lembrar o quanto não gosto de chorar na frente dos outros. Pode ser que a aspereza dela também seja um hábito que eu adquiri, e uso quando acho que devo.

Mas ela, a minha mãe, quando me viu sentada na cama com os pés pendurados e compreendendo as nossos jeitos ásperos de tratar as emoções, não disse nada. Apenas pousou a mão sobre o meu ombro e foi o suficiente para umedecer todo o ar do nosso tempo seco.

*Textos de Quinta - Para fugir da responsabilidade.

Um a cada quinta. Não é promessa, é desejo =)

Marília de Dirceu
Enviado por Marília de Dirceu em 20/08/2015
Código do texto: T5352862
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