CRÔNICA DA FUNCIONÁRIA EFICIENTE

Uma jovem funcionária de repartição pública, respondeu-me: “não tenho facebook, basta os meus paparazzi”. Altiva, despudorada sorriu. Senti inveja profunda, toda metafísica foi paro ralo.

Bastava-lhe não aparecer, não se expor gratuitamente, e tudo quanto nela era pouco se agigantava. Ainda que borrado.

Ela acreditava existir tão completamente, sorrindo aquele batom de sucesso entre adolescentes, tão única e insubstituível, que a minha existência foi pulverizada.

Eu nada, um nada esticado, um nada afinalado, nada estreito, nada afinado. Afiado, um nada adelgaçado, aguçado, delicado. Fino. Um nada. Desejei profundamente ser aquela menina, desejei não ser. Ou melhor, me transformar naquele carimbo que a eficiente operária levava em suas mãos de adolescente apressada.

Fora da repartição, um sol de doer a vista girava em torno da terra sem saber que é a terra que gira em torno do sol. Então, saí para o público da vida. Ela seguiu o protocolo, intocável.

Depois de rever a cena no pâncreas, no baço e nos pulmões, filtrei com animo proporcional à inveja mentida o ardor despudorado da insignificância. Tudo passa, concluí. Corredeira de mal estar, a modernidade é mesmo nada.

Antônio B.

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 14/08/2015
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