Vestibular da Penitenciária Federal da Papuda
Vestibular da Penitenciária Federal da Papuda
(CAMBUÍ, Junior)
Saiu o resultado do vestibular da PFP, os nomes estão expostos nos muros de Brasília. Fato relevante foi o crescimento no número de jovens de classe média e alta aprovados no vestibular. Isto prova que eles estão superando as barreiras e se dedicando muito para conseguir um futuro menor.
Noites acordadas, grupos de estudos, desafios cada vez mais altos e mais difíceis, lutas rivais e fugas cinematográficas revelam todo o esforço e a dedicação que tem que ter para conseguir alcançar um objetivo.
As comunidades mais carentes continuam com o maior número de aprovados, porém os elitistas estão crescendo significantemente. Estatisticamente, os dados revelam que num futuro próximo podemos ter um número de aprovados semelhantes das classes inferiores, o que será um salto enorme para o regresso do país.
A lista de aprovados revela que não necessita muito de talento, ou inteligência, é uma questão de oportunidade, é estar no muro certo, na hora certa. O primeiro colocado é um morador das ruas de Brasília. Perguntado como ele conseguiu essa façanha o rapaz respondeu: “ desde pequeno freqüento as ruas de Brasília, a principio não gostava de fazer isso, com o tempo a gente vai se profissionalizando e enxergando o prestígio que isso traz, principalmente, com as meninas e os muleques do bairro. Então, passamos-nos a se dedicar todos dias.”
Aprovados revelaram que tinham a ambição de chegar ao Congresso, aonde seu “nome” seria destaque em todos os jornais. Com a aprovação esse sonho foi adiado ou até mesmo interrompido, pois alguns saem mudados, outros procuram ambições maiores e a maioria não sai.
Apesar de alguns pais lutarem para que seus filhos não ingressem na PFP, não obstante são sucumbidos pelo descaso do Governo. O que preocupa o governo é que a demanda está crescendo desmedidamente, isso acarretará em novas construções.
Os ex-alunos do CAJE ( Centro de Apoio aos Jovens Estudantes) tiveram um bom desempenho no vestibular, haja vista, que muitos foram os aprovados. Porém, a quantidade diminuiu um pouco. Alguns fatores podem explicar essa queda na aprovação; muitos saíram do CAJE regenerados, outros foram jogar bola “no campo da esperança” e alguns continuam seus estudos básicos e fundamentais.
Impressionante foi o aumento de meninas no vestibular. A “Colméia” em poucos dias estará recebendo novas rainhas. O aumento deve-se, principalmente, a evasão escolar. Fator que eleva o número de inscritos no vestibular.
A “Cega” estará selecionando novos aprovados, após avaliarem os currículos e a faixa etária de alguns alunos matriculados nas DP. Deixa claro, que o ingresso destes depende do número de vagas fornecidas pela PFP.
A evasão de alunos-elitistas ocorre amiúde, devido à posição social dos pais e, obviamente, pela falta de visão da Justiça. Alguns grupos de dedicados alunos-elitistas já ensaiam manifestações contra as concessões de bolsas a alunos pobres. Argumentam que a PFP tem que ser acessível a todos, e não somente a pessoas pobres de classes menos favorecidas, defendem a isonomia penitencial.
A PFP tem em seus aposentos verdadeiros mitos, ícones, que representam a desigualdade social, a discriminação, o racismo, o genocídio dos sonhos das crianças e dos adultos. Um dos maiores deles antes de morrer escreveu essa carta destinada aos alunos das ruas, aos estagiandos, aos calouros, aos pais, ao Governo:
Cheguei em Brasília, trazido pelos sonhos dos meus pai. Meu filho vai estudar, irá passar no vestibular da UNB e será Doutor, dizia. Morávamos de aluguel e o salário só dava pra pagá-lo e comer. Ingressei na escola, apesar de não ter nem o uniforme. Gostava muito de estudar e tinha como objetivo realizar o sonho do meu velho. Nunca reprovei, passava o dia todo estudando, aproveitava minha solidão, pois meu pai trabalhava o dia todo e só chegava à noite, sempre com aquele conselho: ‘Estuda, só estudando que será alguém na vida’. Por ser fã do meu professor de português, disse ao meu pai que queria ser professor. Fiquei com medo de ele ser contra, porém ele disse que eu seria o melhor professor que esse país já teve. Meu professor, meu ídolo me presenteou no meu aniversário com o livro: UMA LUZ NO FIM DO TÚNEL. A Vida me presenteou com a maior e insuperável dor da minha vida, a morte do meu pai. Quando estava indo trabalhar foi assaltado e no assalto acabou sendo morto. A violência invadiu meus livros e ocupou minha mente.
Sem ter parentes, nem amigos, com 12 anos virei morador de rua, abandonei a escola. No início, conseguia arranjar dinheiro para comer. Vigiava carros, trabalhava na feira, entregava jornais, porém com o tempo os muleques maiores começaram a me espancar e roubar meu dinheiro.
A solidão e o desprezo não têm cura na rua. Fui apresentado às drogas, ao crime, agora não estava mais só, tinha amigos de consumo e de crime. Ingressei-me no crime, comecei a roubar para comer e sustentar meu vicio. Porém, meu primeiro crime foi a pichação, isso implicava respeito por parte dos outros meninos. Um dia fomos pichar perto da UNB, porém não tive coragem, lembrei do meu pai. O sonho dele era ver meu nome na lista dos aprovados da UNB e, não no muro da UNB.
Depois de cometer vários crimes e ter várias passagens pelo CAJE (Centro de Atendimento Juvenil Especializado) vim parar aqui acusado de latrocínio. Um dia, fui com uns amigos roubar toca – CDS, quando conseguimos tirar o toca-CD do carro fomos surpreendido por um homem que segurou um de nós, porém Pirulito atirou nas costas do homem e saiu correndo. Eu fiquei inerte, pois aquele homem era meu professor, meu ídolo. Que destino cruel, fui preso por matar, aos 18 anos, meu professor. Que ironia com essa idade sonhava em passar no vestibular e, consequentemente, realizar o sonho do meu pai.
Enfim, hoje, estou com 44 anos e muito doente. Não uma doença do corpo e sim da alma. Se não queres ficar igual a mim, faça o seguinte:
Alunos das ruas: evadem.
Estagiando: não se efetivem.
Calouros: ao regressar à sociedade se regeneram.
Pais: olham os cadernos e os muros que cercam seus filhos.
Governo: não deixe a luz do fim do túnel se apagar.
Assinado: Paulo Feliz Porto
Moral da História: Pequenos passos na direção certa podem te levar à realização dos seus sonhos, pequenos passos na direção errada podem te levar à realidade. Infelizmente, nem sempre controlamos nossos passos.