A DEMOCRACIA COMO VALOR

Sou aficionado pela política desde menino, talvez herança paterna, não no bom sentido. Meu pai, aos 22 anos, foi candidato a deputado estadual, talvez o mais jovem da época, depois de colecionar derrotas, como vereador e vice prefeito. O partido era o PTN, acólito de Jânio Quadros, a meu ver um lunático carismático que arrasou a geração de entusiastas que o seguiam. Na sua renúncia, queimando vassouras, o símbolo do janismo, vi pequena multidão à porta do prédio onde morávamos( um sobrado imenso, de esquina, que dá vista para o jardim da igreja matriz, ainda existente), em Echaporã-SP, em agravo a meu pai, que, pateticamente ( ele que me perdoe), ostentava uma velha carabina de meu bisavô, geringonça que nem sei se funcionava, e que simbolizava a solitária resistência, impávido no alto do prédio, parecendo ator cômico de cinema mudo.. Pouco tempo depois rumávamos para o Paraná, os anos de 1964. Aprendi que idolatrar ídolos é o caminho mais curto para a decepção, humanos falíveis. Depois, na pequena Mariluz-PR, participávamos, entusiastas, das campanhas eleitorais, indo a comícios e carreatas, uma farra de criança. As campanhas interioranas, principalmente em localidades pequenas é ( ou era) uma festa, uma diversão animada. Na adolescência, já em São Paulo, regime militar, fazia boca de urna para o MDB, única oposição à Arena (Aliança Renovadora Nacional, da qual derivou-se o PFL - e depois o DEM, apoio da ditadura), não tinha ainda idade para votar. Acompanhava pelo rádio as apurações, que se estendiam pela madrugada, sempre na torcida. Seguiu-se o ativismo sindical bancário e a filiação ao PT. Testemunha ocular de fatos memoráveis ( e deploráveis) de violência contra os direitos civis. A igreja da Sé,

cercada de agentes federais, além dos enrustidos à paisana dentro da Acrópole, na missa de ato denúncia do assassinato de Wladimir Herzog, jornalista morto nas dependências da cela da ditadura, falsamente forjado como suicídio... A Igreja católica, que inicialmente apoiou o Golpe Militar, foi importante na resistência democrática, fazendo-se respeitar junto aos militares. Abro parênteses para salientar que a OAB, ABI e outros órgãos, diante ao estado de exceção jurídica, pouco podiam fazer, sendo que a Santa Sé, por sua amplitude mundial era respeitada por Instituições Internacionais, sendo temida pelas repercussões negativas caso fossem denunciados os abusos praticados.como foram por diversas oportunidades. As manifestações dos metalúrgicos em São Bernardo, não raro, terminavam dentro da igreja, sob o respeito religioso, e sempre cercada pelos brucutus, prontos ao embate, com seus cacetetes e cães. Emblemático e inesquecível foi o estádio de Vila Euclides, em São Bernardo, lotado de manifestantes, tendo helicópteros em voos rasantes e ameaçadores em histórico 1º de maio. Tivemos atentados em bancas de jornais, a invasão da PUC-SP, outro local de resistência, a morte do Sindicalista Santo Dias e Manuel Fiel Filho, entre outros mortos e desaparecidos, as cassações de lideranças sindicais, invasões em sindicatos, as fissuras do regime que clamavam LIBERDADE .Só quem viveu não quer repeteco, aliás, quer a DEMOCRACIA, os direitos civis respeitados, a cidadania preservada...