"ENTRE UM ANJO E UM CAPETA"

Certa feita fui contra um determinado governo em Mato Dentro, durante os quatro anos de seu mandato, pensava com meus botões: (sei que esse povo fará muita besteira), então decidi que durante o comando deles eu não pagaria um centavo de imposto e disse para mim mesmo:

—Não serei conivente com as trapalhadas que certamente virão e com meu pobre dinheirinho, não devem contar, não vou financiar nem uma pedra de sal para esses companheiros.

Podem mandar-me para a dívida ativa, que se dane, quando saírem, negociarei a dívida e resolvo a situação. Assim o fiz.

No governo seguinte negociei a pendência e estou em paz comigo mesmo e em dia com meu Município.

Naquele mandato, porém, permaneci absolutamente recluso, totalmente no anonimato e recolhido à minha insignificância.

Vi todo tipo de desmando, todo tipo de truculência, toda a inoperabilidade praticada, até fechamento de núcleos escolares, entre outras coisas, presenciei.

Também pudera, com uma administração que tinha como base, pessoas de fora, por que se interessariam pelo meu Município?

Jamais poderia concordar com um disparate daqueles.

Percebia nitidamente em meus ombros, um capetinha e um anjinho, os dois sempre estavam em disputa e a todo minuto falavam sem parar na minha cabeça, um instigava-me a detonar com tudo e todos e o outro me pedindo calma, comecei a ouvir mais atentamente o tal anjinho e disse novamente para mim mesmo:

— Contenha-se rapaz, você não é ninguém, respeite a decisão do povo, você perdeu a eleição, isso é fato, não se martirize, o povo é soberano e na hora certa esse mesmo povo que colocou esses companheirinhos lá no Paço, os tirarão do poder.

Como dizia minha sogra “Que Deus a tenha”:

—Sossegue o pito camarada, nem pense em besteira, sua família precisa de você. Segui o anjinho e os conselhos de minha sogra. A sua pergunta com relação a esse trololó todo deve ser:

—Que porcaria de texto é esse? Onde esse idiota quer chegar?

Respondo:

—O idiota não quer chegar a lugar nenhum, posto que já chegou, do alto de seu mirante imaginário vislumbra alguma(s) pessoa(s) que desce(m) o cacete no governo atual, chamando-o de corrupto, salafrário, tirano e outros bichos mais e volta e meia está ali, como quem não quer nada, comendo uma migalhinha aqui, outra ali, degustando um queijinho aqui outro acolá, aí lembro duma musiquinha sertaneja que tem um verso que diz: “fingindo de leitão, pra poder mamar deitado”.

Novamente o capetinha em cima do meu ombro quer se manifestar e o retardado do anjinho chega colocando panos quentes:

—Calma rapaz, não se precipite, falta de caráter e gente com duas caras existe desde a época de Jesus Cristo, esqueceu de Judas, aquele das trinta moedas?

Fique tranquilo, em Mato Dentro, ainda existem árvores e cordas de sisal, qualquer hora um pescoço será preso, esquenta não, deixa de ser tão idiota e vá cuidar de sua vida. Não é que o raio do anjo tem razão?

Marçal Filho
Enviado por Marçal Filho em 07/08/2015
Reeditado em 03/12/2023
Código do texto: T5338530
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