MEMÓRIAS ( 5 )

Hay, Platero, bellezas culminantes que en vano pretendem otras ocultar. Como en el rosto tuyo los ojos son el primer encanto, la estrella es el de la noche y la rosa y la mariposa son del jardin matinal.
Platero, mira qué bien vuela! Qué regocijo debe ser para ella volar así! Será, como es para mí, poeta verdadero, el deleite del verso. Toda se interna en su vuelo, de ella misma a su alma, y se creyera que nada más le importa en el mundo, digo en el jardin.
Cállate, Platero ... Mírala. Qué delícia verla volar así, pura y sin ripio*.

( Platero y yo - Juan Ramón Jiménez - Taurus Ed. S. A. - 1974 )

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Memórias
 
A inquietude das borboletas! Devia ser essa a sensação que sentíamos quando íamos ao parque de diversões. Nos preparávamos logo cedo, em dias amenos de inverno, aqueles previstos como agradáveis e ensolarados. Sem muitas preocupações, saíamos para pegar o trem que, como de costume, nos levaria ao nosso destino. 
 
Ao apito, o trem partia e as casas, os campos, as estações, corriam velozes, num borrão a se alternar entre o verde e o marrom; um desfile de vegetação, casas, postes, cercas, fábricas, reduzindo, parando, partindo, correndo. Lapa, Água Branca, Barra Funda, Luz... Descer na estação do Brás, pegar um ônibus, chegar ao parque...Os brinquedos, o cachorro quente, o algodão doce, a pipoca e o refrigerante. Nessa época, meu pai já trabalhava na Cia. Antarctica, na Moóca. Estava sempre pela região e sabia de tudo que acontecia. 
 
Num desses passeios, foi nos conduzindo até um lugar central do Parque Shangai, onde havia um aglomerado de pessoas. 
 
Queria nos mostrar uma novidade: sobre um pedestal, dentro de uma vitrine, havia uma boneca, uma figura de mulher bem vestida, usando um chapéu, com uma bolsa pendurada no braço. 
 
E ela ria ... às gargalhadas. Chacoalhava e dobrava de tanto rir; inclinava-se para frente e para trás, a boca pintada de vermelho, dentes grandes e brancos, flores no chapéu, ela ria. 
 
Para ter acesso a tal “brinquedo”, bastava chegar perto. O espaço era aberto. As pessoas, contagiadas pelo som, riam, riam muito. Riam de graça, da graça contagiante do riso da boneca, do riso dos outros, ao lado, em grupos. O riso ecoava ao redor e era contagiante; quem se aproximava, já vinha rindo. Rir era gratuito: a única coisa pela qual não se pagava. 
 
Nada mais importava a não ser aquele momento de pura diversão. Podia-se ficar ali um tempo infindo; os risos, borboletas voando alegres pelo jardim.
 
*rípio: Fig. Palavra que se insere num verso para completar-lhe
a medida. ( Aurélio )