Mordida de Cobra

Sabe estas conversas meio bestas que surgem quando você estásentado numa varanda com o chão de madeira, numa tarde que já cansou a você e a ela mesma, com o calor e a secura enorme?

Falta a noite chegar. Todo mundo anseia por ela, e pela promessa de frescor que em algumas terras, como esta aqui, desértica, a gente tem. Daí, vem a conversa:

- Não há mais nada a fazer...

- Nadinha?

- Nadica de nada. A mordida foi bem no pescoço, e o cara já está até parando de variar. Acho que dura mais só o inicinho da noite.

- Mas que cobra foi esta?

- Não sei, mas foi das bravas. Veneno dos bons, de rachar côco só com o respingo.

- É, até que o cara agüentou alguma coisa, né?

- É, mas agora é melhor morrer mesmo...

- Que é isto! Que brutalidade, cara!

- É que ele, quando viu que ia morrer, resolveu contar tudo...

- Tudo o quê?

- Tudo.

- O quê?

- Que ele deu...

- Ele? Impossível! Macho daquele jeito, não podia.

- Mas deu. E contou pra quem foi...

- Jura?

- Parece que você estava na lista...

- Mentira!

- Mas se você tomar uma mordida de cobra, será que você conta?

- Se for dessas brabas daí, acho que sim...