Inverno
Inerte estava eu, contemplando as chamas que consumia o meu mundo sombrio, de alma fria e coração negro, meus sentidos se atentavam para o funeral interior que me invadia. Como um navio sem âncora, vagava pelo mar sereno, avistando o fim da tragédia. Entre as rochas nasce uma rosa, e um raio de sol atravessou aquelas ondas refletindo a cor dos olhos do anjo que me resgatou.
Carregava magnetismo em suas mãos, que persuadiam as minhas, desenhando suas palavras, rabiscando em minha pele. No diálogo silencioso, nossas vozes ecoavam nos olhares intensamente invasivos, onde palavras seriam barulhentas, diante da sensibilidade daquele momento. Dentro daquele ser, sua dualidade oscilante. Canta para mim no tom sublime, e completo sua música como um dueto perfeito.
Soa como um reencontro de almas, pois sinto que já estivemos aqui antes. Visão esperada, reconheço cada movimento futuro. Enquanto me decifras, eu te sigo, enquanto me desenhas eu te transformo em letras. Caminhamos sobre o mesmo solo, trocando passos sincronizados e isso nos faz gargalhar como crianças perdidas na inocência mascarada de aventura e malícia.
Flertava com o meu riso, e o seu timbre rico em encantos me roubava espaços vazios de cada parte de mim, inacreditavelmente não fugi, mas o medo do final daquela estação me assombrou, e era o seu mesmo temor. Levou minhas memórias e minhas dores não reveladas, adormeceu no meio do deserto confiante de que minha presença era seu refúgio reciprocamente.