Meu primeiro poema

A crônica de hoje é bem curta.

Tem algo de nostalgia e de reflexão sobre quem eu sou. Pode servir, inclusive, na vida de muitas pessoas como você, caro leitor. Talvez, na sua adolescência ou início de sua juventude, a formação da sua personalidade e da sua auto-estima passou por muitos altos e baixos, em picos fortíssimos de emoção.

Vou falar sobre o momento que compus o meu primeiro poema, com 15 anos.

Eu, como adolescente, vivia naquela crise de auto-estima. As poucas garotas que se interessavam em mim não eram muito interessantes, tanto física quanto emocionalmente. Por outro lado, sempre me achava feio. Em meu pensamento, a lógica natural era que, à proporção do meu parco atrativo físico e pessoal, se achegavam garotas com o perfil similar ou inferior ao meu.

Em poucas palavras: um lixo!

Entre crises de identidade, mexendo na minha parca auto-estima, com sentimentos de auto-comiseração e até de leve inveja dos mais próximos, vivia agoniado. Não sabia expressar o que sentia.

Queria vingar-me do mundo. Queria, em meu pensamento, privar todos esses carinhas "pegadores de mulher". Ter uma ascenção econômica e fazer muita gente sentir recalque. À minha disposição escolher, entre as mulheres mais lindas, interessantes e sensíveis, quem mais se adequasse à minha ingênua idéia de "mulher ideal".

Estava refém dos meus sentimentos amargurados. Meu pensamento girava em torno de tudo quanto sentia.

Até que, nesse ínterim, travei uma amizade com a filha mais velha do pastor da igreja onde eu era membro.

O nome dela era Lílian.

Branca, cabelos castanhos lisos, estatura mediana, com o semblante e o físico bonito. Era comunicativa e muito carismática, por sinal. Tinha um número de amigos muito grande, por conta da sua atuação como liderança da Associação Prata de Adolescentes.

Ela era o tipo de garota, aos meus olhos, muito interessante e que correspondia ao "tipo ideal" de mulher que sempre pensei.

Passei a estar mais freqüente na igreja, fazendo companhia a ela nos cultos de quarta ou em outras atividades extra-eclesiásticas. Tornei-me, de fato, um grande confidente dela. Todas as evidências indicavam isso, diante do elevado grau de confiança (cria eu) que ela tinha em mim.

Achei que o namoro era apenas mera questão de tempo.

Ledo engano! Erro crasso!

Houve um evento dos adolescentes batistas cariocas, no Campus São Cristóvão do Colégio Pedro II. Pensei, em meus botões, que aquela seria a tarde para tirar o meu atraso. Ufa! A Lílian estaria nos meus braços! Estaria envolvida comigo, naquela visão romântica - um tanto quanto idealista e ingênua, marcada por muita pureza.

No entanto, fiquei estupefato. Vi de longe, ao lado de uma das pilastras do colégio, Lílian beijar torridamente um rapaz. Era uma daquelas cenas cinematográficas dignas de um beijo bem ardente e apaixonado. Pareceu, de imadiato, que aquele era o rapaz da vida dela.

Povoou em mim imagens de tristeza, raiva e profundo ressentimento.

Momentos depois, como se nada tivesse acontecido, Lílian me saudou. Sem saber que eu tinha visto tudo o que acontecera, ela quis beijar a minha face. Recusei polidamente, diante da afronta que tinha sofrido.

Ela não entendeu o porquê da recusa. Da minha parte, nem quis falar. Não queria magoá-la. Já bastava, por si só, a minha tristeza. Perdia aquela tarde nublada de sábado.

Voltando para casa, entre o choro convulsivo e o sentimento de perda (ainda que platônica), tive um raro momento de inspiração e compus o que seria um (senão, o principal) dos poemas que mais me marcaram, enquanto homem:

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Não lhe conheço direito;

Não sou perfeito

Para julgar-me capaz

Em conhecer-te demais.

Espero que esse novo amor

Dure desde a mocidade

Até onde for, repleto de vigor,

Conservando esse singelo amor.

Que este soneto,

Para você feito,

Seja algo bastante significante.

Mesmo se nos meus versos houver algum defeito

E, para mim, a morte um dia trouxer o seu leito,

Espero fazer para você versos marcantes.

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Daí, uma nova crise de choro começou, no momento que li o que compusera há poucos segundos atrás, sem acreditar naquilo que tinha sido capaz de escrever.

Foi assim o meu batismo literário, como um aspirante a poeta. Em função, tão somente, da minha dor.

Meu primeiro poema...

Tudo por conta de um amor não-correspondido.