UM, DOIS, TRÊS E JÁ

Ao lado morava o seu Adolfo, um alemão que mal falava o português, duas casas, ambas de madeira, verdes com janelas venezianas, entre 13 e 16 horas nenhum pio, pois o vizinho estava sesteando. Sisudo e fechado não dava chances de olhos nos olhos, minha memória lembra dele entre os meus cinco e nove anos. No momento da sesta dele eu aproveitava para fazer os temas, às 16:30 a Piratini e a Gaúcha punham o sinal de ajuste no ar. Ansiosamente esperávamos as 17 horas para que a programação entrar no ar.

O muro que separava a casa do seu Adolfo e a do padrinho Irineu tinha um cinamomo entre ambos os pátios, morto pelas podas sucessivas ele foi cortado, permanecendo a raiz e o tronco, pela morte precoce ele não preencheu o espaço deixado entre o muro e a casca, este espaço servia de fresta onde a netinha de Adolfo espiava a televisão. A sorte dela alinhava-se com a porta e a frestas. Enquanto a programação não começava travava-se um luta verbal entre o vizinho avô e a avó, segundo a tradução da madrinha Zilda o Adolfo queria proibir a netinha de acomodar-se num banquinho e pela fresta assistir Guilherme Tell e Ivanhoé, mesclados entre desenhos animados. Era um cinema sem direito a pipocas e qualquer outra guloseima, pelo menos do lado de lá. As vezes contávamos um, dois, três e já e então virávamos as cabeças repentinamente e a menininha esquivava-se como se não quisesse que a víssemos na sala de cinema a céu aberto sem ter pago entrada.

Muito tempo depois entendi que a rabugentice de Adolfo ajudou-me na escola, por isto sempre levava o tema feito e recebia elogios da professora.

ItamarCastro
Enviado por ItamarCastro em 29/07/2015
Reeditado em 31/07/2015
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