Conversas de uma lembrança

São 3h45 e meus olhos não conseguem fechar. Sinto o cansaço na cabeça, sinto o peso no corpo, mas há alguns dias que não consigo dormir. Na verdade, tenho medo. Estou aprisionado dentro dos meus próprios pensamentos e tenho medo de como poderá ser o próximo dia se eu adormecer hoje. Quando criança, achava que os monstros se escondiam de baixo da cama ou dentro do armário. Mas agora, depois de crescido, percebi que eles sempre estiveram dentro da minha mente. Eles continuam lá. E eles também cresceram. Só que não tenho mais como correr para a segurança do quarto dos meus pais no meio da madrugada. Não existe mais aquele abraço protetor para afagar e afastar todo o perigo. A única cama que existe é a minha. Não há como me esconder sob os cobertores, fechar os olhos ou tentar fingir que é mentira. Eles, os monstros, estão aqui. Todos eles.

A cada noite que passa, tenho a sensação de que o corredor fica mais longo e as paredes se afastam uma das outras, como se os cômodos ficassem cada vez maiores ou eu que diminuísse. Essa casa está cada vez mais preenchida por vazios. Em cada canto, uma lembrança do primeiro dia. Na janela, a recordação de cada pôr do sol. Nas paredes, as marcas de todos os momentos. É até engraçado pensar que meu maior medo aqui já foi o barulho da porta sacudindo com o vento em meio a madrugada.

Mais uma tentativa. Desligo a luz e coloco a cabeça sobre o travesseiro gelado. Já que estou atrás das grades da minha mente, esse é o momento para pensar e questionar-me. Será que vale a pena passar por tudo isso? O que estou construindo? O que estou procurando? O que eu quero? Era março de 2009. Me recordo muito bem do primeiro dia que coloquei os pés no ônibus para uma viagem que bagunçou completamente minha vida. Cheguei à estação um pouco antes das 17h. Estava chovendo e eu não conhecia ninguém. Foram diversos dias e noites, muitas horas na estrada, inúmeras risadas, várias boas histórias. Até, finalmente, me estabelecer em uma vida nova. Mas por que uma vida nova?

O mundo é cruel. Não importa o quão triste você está, ninguém vai bater à porta para perguntar como está ou se precisa de alguma ajuda. Não importa o quão feliz você está, ninguém vai compartilhar do mesmo sentimento. O quanto ainda somos sociáveis? Protegidos por vidros à prova de balas, seduzidos pela tela de seus celulares e preocupados com o capital, o que resta são alguns traços de um ser social.

Ninguém nunca me perguntou se eu queria crescer. Ninguém quis saber se eu estava preparado para ter problemas e responsabilidades de gente grande. Eu nunca quis nada disso. Era feliz quando chegava a casa depois da escola e sabia que alguém estava esperando para me abraçar quando estivesse com medo. Era feliz quando as únicas preocupações eram jogar bola na rua, subir em árvores e andar de bicicleta. Era feliz quando minha mãe brigava comigo por estar andando descalço. Mas o que é felicidade hoje? Na verdade, ninguém é feliz. Vivemos em busca dela a vida inteira, mas ela não passa de uma invenção, uma fantasia, uma utopia. A felicidade é um estado, são momentos, instantes. Estaria me iludindo se vivesse em busca da “felicidade”. Mas então para que estou vivendo? O que estou buscando? Por que estou escrevendo essas palavras? Por que daqui a uns cinco minutos vou ter uma visão completamente diferente de tudo o que escrevi agora? Não sei. Vivemos para fazer perguntas. Respostas são monótonas.

Aldir Junior
Enviado por Aldir Junior em 27/07/2015
Reeditado em 28/07/2015
Código do texto: T5326039
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