ÓDIA
Minha vizinha é de seu natural bastante irritadiça. Por um nada qualquer frita os ovos de raiva. Isso é mais que esperado numa pessoa que tem 6 filhos, cada um menor que o outro, cada um tão endiabrado quanto cada uma. Genitora de alto desempenho, cria os filhos e esses criam razões para que fique num lastimável estado de nervos. Mas apesar da raiva, ela nunca chega ao ódio, que é um sentimento condenável, justamente por ser o inverso do também irracional amor. O amor e o ódio não possuem muitas justificativas. Não há como controlar o ódio com racionalidade. Ódio não é controlado, é descarregado. Como ocorreu e ocorre com ódios como o nazismo, o racismo, a homofobia, o nacionalismo (sim, encaro o nacionalismo como ódio, e acho que nem é necessário explicar porque) e a misoginia. Alguns ódios decorrem do medo. Que é uma explicação que não explica satisfatoriamente e nem nos permite compreendê-los muito. Mas o ódio funciona como um indício de que algo vai mal, indício de um desvio de caráter, de temperamento necrosado e claudicante. De reação negativa ante a ameaça, a insegurança e o medo do mundo. Ódio é um saco de pancadas, e quem sofre com ele é o bode... expiatótio. É triste saber que uma pessoa odeia por odiar. Não tenho certeza, mas acho que é isso que explica a extrapolação nervosa vicinal feminina de hoje. Ódio, ódio mesmo ela não sente. E foi por isso que ela disse, em dado momento, para sua alcatéia de filhos que: "Eu tenho ódia por vocês por não fazerem o que eu mando!." Certo! Variou apropriamente o gênero. O que ela não sabe, seguindo a minha linha de ilações não fundamentada, é que o ódio masculino é tão pernicioso tanto quanto a ódia feminina. Ódio independe do sexo. Vou tomar cuidado para não odiá-la. Mas cuidado nesse caso não adianta. Ela mora ao lado, mas alcança minha casa com sua língua ferina, língua especializada em antropologia da vida alheia e em desfechar flecha naqueles por quem sua dona sente ódia. Falo isso porque não respeito a privacidade de ódia que tem por hábito pular muro...