Mestiços Inclassificáveis, por enquanto...

Há muito era preciso registrar o desconforto, que penso ser de muitos brasileiros, ao responder no questionário dos censos demográficos do IBGE àquela pergunta: “A SUA COR OU RAÇA É: 1 - BRANCA; 2 – PRETA; 3 – AMARELA; 4 – PARDA; e 5 - INDÍGENA”?

Esse desconforto começou a ser justificado, ou esclarecido, quando nas pesquisas sobre o conceito de indígena encontrei:

- o critério de identificação adotado pelo Brasil para o indígena é o da “autoidentificação”, ou seja, o que decide se um grupo de indivíduos pode ser considerado indígena é o fato deles próprios se considerarem índios e de serem considerados índios pela população que os cerca; e

- no Art. 3º da Lei 6001 de 19 de dezembro de 1973, conhecida como Estatuto do Índio: “I - Índio ou Silvícola - É todo indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional”.

Ou seja, a conceituação pressupõe grupo étnico distinto da sociedade nacional.

Mas, mais justificativas e esclarecimentos ocorreram ao continuarmos pesquisas em busca de alívio a esse desconforto, quiçá, da maioria da tal sociedade nacional:

- a criação do conceito de raça foi tentativa para explicar as diferenças entre os grupos da espécie humana, diferenciados geograficamente pelos continentes;

- desde que se iniciou a utilização de métodos científicos para o estudo de populações humanas, que o conceito de raça não pode ser aplicado, pois não existem genes raciais para nossa espécie;

- para o professor de Harvard Henry Louis Gates Jr.: “o Brasil é a expressão máxima da miscigenação populacional ninguém é puro. E é por isso que o Brasil tem a cara do futuro"; e

- raça pode ser um conceito político e ou social, mas nunca científico;

Todos sabem que os principais e maiores grupos continentais responsáveis pela genética brasileira são os ameríndios, africanos e europeus, em especial o português.

Com relação ao português, bastante miscigenado devido às inúmeras invasões sofridas, bem como sua alternância histórica como dominador e dominado. Já, a origem do nosso índio, ainda na construção de hipóteses, oscila entre Ásia, Oceania (Polinéisa) e África, sem o descarte da possibilidade da ocorrência das três conjuntamente. Por sua vez os escravos africanos de etnias as mais diversas, tiveram origem predominantemente da região subsaariana, no continente africano.

Foram estes durante os primeiros séculos os grupos humanos que iniciaram a genética brasileira, com algumas contribuições menos relevantes de franceses e holandeses. Os primeiros no litoral carioca e do Maranhão e os holandeses em Alagoas, Paraíba e, principalmente em Pernambuco.

Foi depois de nossa independência, 1822, que essa miscigenação primeira passou a receber, fluxos migratórios relevantes, onde alguns mais abertos e integrados passaram a misturar-se com povo mais do que diverso já existente.

Em ordem decrescente de estimativa de imigrantes: Portugueses, 1,7 milhão; Italianos 1,5 milhão; espanhóis, 700 mil; japoneses 250 mil; alemães 200 mil; poloneses 60 mil; e árabes (sírios, libaneses e turcos), 58 mil...

Finalmente vamos complementar esse conjunto de informações com alguns resultados da pesquisa feita em nove celebridades supostamente de ancestralidade africana, da qual destacamos os resultados para as análises do DNA de:

- o sambista carioca Luiz Antônio Feliciano Marcondes, o Neguinho da Beija-Flor, 67,1% europeu; 31,5% africano; e 1,4% ameríndio;

- a ginasta Diana dos Santos, 40, 8% europeia; 39,7% africana; e 19,6% ameríndia; e

- a atriz Ildimara da Silva e Silva, Ildi Silva, 71,3% europeia; 19,5% africana; e 9,3% ameríndia.

Mas, voltemos ao início onde nos referimos ao questionário do censo demográfico e o critério de autoidentificação adotado pelo Brasil para identificar o indígena, um grupo étnico distinto da sociedade nacional.

Agora, levando em consideração tudo o que até aqui foi exposto, façamos os seguintes questionamentos: se para o indígena existe o critério de autoidentificação, porque não existir para os outros grupos étnicos o mesmo critério? Qual seria o grande grupo étnico da sociedade nacional que o diferenciaria dos outros grupos étnicos menores

Ainda mais, façamos especulação sobre as respostas e as prováveis dúvidas ocorridas quando as celebridades em destaques responderam à pergunta do questionário do censo.

Para quem leu a matéria sobre a pesquisa que traz comentários dessas celebridades sobre o resultado da análise de seus DNA’s, parece óbvio: que uma dessas celebridades respondeu que sua cor ou raça é Preta (apesar de que ficaria mais satisfeita se o termo fosse negro); a outra ficou certa de que não poderia assinalar nem branca e nem amarela, mas titubeou entre Preta e Parda, mas preferiria que os termos fossem negro e mulato. E, a terceira celebridade, pelo tanto de contentamento que demonstrou com o resultado, é muito provável que assinalou Parda, mas sentiu-se frustrada por não ter alternativa que não representasse qualquer vinculação à cor de sua pele, mas a diversidade de seu DNA, bem equilibrado entre os três grupos continentais formadores da genética brasileira.

Outra especulação que não nos sai da cabeça e quantos brasileiros, ao responderem essa questão não teriam o provável e especulado sentimento da terceira celebridade.

Quanto de nós brasileiros não se sente nem África, nem Europa, nem Ameríndio, mas algo diverso com a presença forte dos três, mas sem identificação restrita a qualquer dos partícipes dessa bendita miscigenação. Não seria esse grupo de mestiços de difícil classificação o que os legisladores chamam de sociedade nacional?

Para finalizar, vamos utilizar o talento de síntese dos poetas, e transcrever canção do poeta, músico e cantor Arnaldo Antunes (1996), “Inclassificáveis”, que muito fortalece resume o cerne dessa reflexão:

Que preto, que branco, que índio o quê? / Que branco, que índio, que preto o quê? / Que índio, que preto, que branco o quê? / Que preto branco índio o quê?/ Branco índio preto o quê? / Índio preto branco o quê? / Aqui somos mestiços mulatos / Cafuzos pardos mamelucos sararás / Crilouros guaranisseis e judárabes / Orientupis orientupis / Ameriquítalos luso nipo caboclos / Orientupis orientupis / Iberibárbaros indo ciganagôs / Somos o que somos / Inclassificáveis.

PS: Muitos dos dados e informações aqui citadas tiveram como fontes:

Artigos:

O QUE É O ÍNDIO

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/4537478

ORIGEM DO ÍNDIO BRASILEIRO

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/4549150

SITES:

bbc.com; e

Wikipédia.com

J Coelho
Enviado por J Coelho em 21/07/2015
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