Motivo Justo
 
Na quarta-feira, o aviso na porta: “Não abriremos hoje”. Mais abaixo, em letras menores e entre parênteses “motivo justo”. Fui embora pensando: motivo justo! Vou discutir? De jeito nenhum! Cada um sabe dos seus motivos e quem somos nós pra questionar o que é justo ou não. Então que o motivo justo do não-atendimento fosse respeitado.

A portinha fechada era a do Papo e Café, um espaçozinho de lanches que um jovem casal abriu aqui perto de casa.  E embora não tenha muito onde se entabular um papo, o café é bem simpático. O melhor é o pão de queijo que a moça faz na horinha. Ela me contou que se levanta de madrugadinha pra que o freguês encontre bem quentinho o que faz as maravilhas do café da manhã dos mineiros.

Pois bem, não tinha pão de queijo. O Papo e Café foi fechado por motivo justo. E achei bem bacana a gentileza do aviso. Seria mais deselegante não ter nada pregado na porta. Porque às vezes acontece no comércio: o dono precisa resolver alguma questão, fecha as portas e deixa o freguês pensando que vai voltar de imediato. Nem sempre volta. E aí olha o tempo perdido.

Motivo justo! Desejei que não fosse nada sério com o casal. Mas não deixei de pensar em qual seria aquele motivo justo:  uma viagem inadiável, uma doença em família, um luto, uma consulta médica, uma audiência no Fórum, uma visita a um parente distante, uma compra necessária numa cidade maior, uma... Ih, tanta coisa que nem dá pra enumerar.

Na quinta passei pelo local. Funcionamento normal, a todo vapor. A moça veio me receber, já adiantando:

— Pão de queijo quentinho, né?

Confirmei e fui logo deixando meu motivo justo para a ausência no dia anterior:

— Cês fecharam ontem, né?

Ela colocou na minha frente um pãozinho de queijo dourado e fumegante e foi explicando:

— Fechou, sim. A gente tirou o dia pra uma pescadinha no São Francisco.

— Pescadinha?

Ela abriu seu sorriso bonito e convincente:

— Pescadinha, uai! Que ninguém é de ferro, né?

 É mesmo, uai! Uma pescadinha! Quer motivo mais justo?