Pegou a caneta e escreveu alguns textos sem nenhum nexo aparente. Apenas pensamentos dispersos que distraidamente colocava no papel numa sequência ilógica, criando assim um arrazoado de palavras que se transformavam em frases sem sentido. Apenas abstrações desprovidas de um real significado.

  Então pensou: se as reunisse adequadamente, talvez conseguisse formar uma ideia coerente, um pensamento lógico, uma mensagem objetiva ou coisa parecida. Ficou nessa indecisão por algum tempo, dando tratos à bola na esperança de produzir algo que considerasse aceitável.

Na verdade, não era a primeira e nem seria a última vez que fazia coisas do gênero. Em algumas raras oportunidades até conseguia, ao final de algum tempo, puxar o fio da meada e formar um conjunto homogêneo de palavras com algum sentido, gerando em decorrência algumas crônicas, contos, poesias e pensamentos. 

  Quando isso acontecia, salvava tudo em um diretório do computador para eventual uso futuro, mesmo que fosse somente para reler de vez em quando. Sabia que os textos não possuíam maior significado literário e representavam apenas um momento reflexivo sem maior importância. Um produto final desprovido de ambições maiores, a não ser um somatório de abstrações simples e de certo modo ingênuas sobre fatos que vivenciara. E ao final de cada período criativo, meditava sobre o material produzido na esperança de encontrar algo que o motivasse a fazer um trabalho digno que chamasse à atenção do leitor.

   Na maioria das vezes essa tentativa só servia para causar uma espécie de vazio em sua mente, o mesmo que impedia, objetivamente, que desse forma e conteúdo a uma obra que o recompensasse pelas vezes em que tentara passar ao papel a essência de sua criatividade; sempre na perene esperança de conferir graça, vida, leveza e beleza a essas ilações.

  Essa dificuldade seria devido a ausência de uma musa inspiradora? Ou a falta da essência primordial que somente é encontrada nos que possuem o dom do pleno e irrestrito  domínio da mais pura expressão literária? Poderia ser qualquer coisa, e não teria como descobrir a causa responsável pela falta de criatividade que o acompanhava fazia tempo, permitindo até que pensasse em desistir da ideia maluca de tentar um dia chegar a produzir um texto aceitável. 

  No entanto, foi perseguindo esse quase e utópico ideal, que ao final de algum tempo conseguiu publicar quatro livros contendo os seus devaneios mais expressivos, que depois condensou na forma de textos ecléticos que abrangiam temas do cotidiano e dos sentimentos que o assolavam continuamente. Uma espécie de registro consciente sobre o seu eu que foi revelado sutilmente nas entrelinhas e exposto atrevidamente em cada caractere de sua potencialidade descritiva; apresentada sem sofismas e desprovida de artifícios que a dissimulassem, independentemente dos méritos  a serem atribuídos à obra em si.

 Dentro desse raciocínio, continuou a sua cruzada à procura do texto perfeito que exprimisse, com clareza, o sentimento que se escondia dentro de si e inibia a essência imaginativa que o privava do real e imprescindível conhecimento de sua potencialidade literária.  
Cronista
Enviado por Cronista em 15/07/2015
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