Criação de filhos: A Segurança Alimentar
Observando alguns comportamentos de pais e mães e a agitação de seus filhos ao se depararem com qualquer “coisa que se coma”, seja na rua, na feira e ainda na casa de quem vão visitar, não importando se é apenas conhecido ou parente (já que erroneamente muitos acham que seja sinônimo de invasão de privacidade), descobri que a falta de rotina na alimentação, sem hora certa para café da manhã, por exemplo, que às vezes sai, outras não; o almoço que varia das 11 as 14 horas, a janta que pode vir tão cedo como um lanche ou quase de madrugada, refletindo numa insegurança alimentar que faz com que essas crianças fiquem o tempo todo apreensivas, procurando alimentos, e quando os acham, exageram no seu consumo, o que obviamente é uma forma de sobrevivência, sem acrescentar o quesito emocional. Na casa de visitas, dão a impressão que passam fome e em seu desespero, pedem por comida para os donos da casa, muitas vezes escondidas dos pais. Irônico é pensar que esses pais se zangam quando se comportam assim, mas não mudam suas atitudes em prol da solução desse problema.
O detalhe é que as crianças são vitimas dessas oscilações não porque provêm de famílias pobres, de baixa renda e com dificuldades financeiras básicas, mas sim de famílias em que seus pais possuem renda fixa e satisfatória, em sua grande maioria nível superior e acesso ao conhecimento, pelo menos teoricamente. Algumas crianças, um pouco mais felizes tem babás em prontidão durante o dia, o que ameniza essa insegurança, mas não tem muita sorte já ao fim da tarde e no período noturno quando seus pais, livre dos afazeres trabalhistas, chegam em suas casas e não são capazes de organizar o restinho do tempo com seus filhos, seguindo uma rotina das necessidades básicas, cumprindo o papel de mãe e pai suficientemente bons, algo que todo ser humano é capaz de fazer. A mãe e o pai dessas crianças, se parecem com rei e rainha. Eles não sabem fazer basicamente nada referentes aos serviços domésticos, talvez se sintam superiores e importantes demais para isso. Não podem no fim de semana curtir a família em casa porque não sabem preparar uma comida decente, um almoço em família. São eternos dependentes da boa vontade dos outros em convidar-lhes, ou das pessoas que precisando de dinheiro oferecem sua mão-de-obra, das donas cozinheiras com seus dotes artísticos dos restaurantes...
Não me entendam mal! Claro que se tem uma boa renda, é normal comer de marmitas, frequentar restaurantes, comidas prontas congeladas e nada saudáveis. Ninguém está sendo injusto. Mas refiro ao que eu poderia definir de “alienação do lar”, das características que o compõem, da importância da criança se sentir segura em sua plenitude, o que perpassa ter câmeras de segurança por todo lado, guarda-costas, portões de ferro e cães treinados. Refiro-me a uma espécie de abandono, porque dar beijinhos no rosto e brinquedos interessantes, não substitui o afeto pleno, que inclui sem pretexto a satisfação das necessidades básicas da criança, que fica a mercê da boa vontade dos adultos para se sentir física e emocionalmente bem.
Para compreender essa situação, é uma questão de empatia: como se sentir bem, se a barriga está com fome? Se tratando de uma criança maior ou um adulto que tem a capacidade abstrata de pensamento (se supõe, segundo Piaget), essa necessidade pode ser adiada por uma compensação a longo prazo, mas não para uma criança menor, que o corpo com necessidades vitais imediatas deve ser alimentado para funcionar adequadamente.
Prezados pais ou responsáveis, essa é uma forma de abandono e certamente tem reflexos negativos no desenvolvimento da criança, que não sabe a que momento terá seu alimento, seu banho, sua cama para repousar. Ah! Acabo de lembrar-me o quanto é penoso ver crianças derrubadas de sono, ou mesmo dormindo em pedaços de lençóis, nos sofás alheios, só porque seus pais querem curtir um pouco mais, fofocar, altas gargalhadas, enquanto até a natureza em sua sabedoria já está em repouso, e suas pobres crianças com os corpos desengonçados, mal aconchegantes (apesar de terem o melhor colchão em suas casas! E adianta mesmo?), dormem esperando que seus pais amadureçam e um dia se toquem que criança precisa de casa e pais seguros. Infelizmente, quando esses pais acordarem, seus filhos já se foram do ninho, e não raro, estarão por aí reproduzindo o que aprenderam, assim como deve ser o caso de seus pais. Na verdade, é um ciclo vicioso, mas alguém tem que se conscientizar e recomeçar... Se você ao ler esse texto se identificar, já não poderá dizer que não sabia. Conscientização é isso: perceber, conhecer e partir para a ação. Diga não ao abandono infantil em todas as suas formas...