O AMOR EM MINHA VIDA
Dizem que o mundo está um caos e que só existe desesperança; que as pessoas estão cruas, egoístas, más, que tudo gira em função de interesses e que a mola que nos sustenta é aquela que nos coloca lá em cima, acima dos outros. Não é verdade!
Pode ser que a maioria seja assim, mas o que eterniza a nossa raça e faz com que nossa espécie sobreviva é o amor, seja na nuance que for desenhado. No quadro da vida o que dá o tom é o amor. E mesmo que sejam poucos os que compreendam e tenham este poder, são esses que fazem a cama todos os dias para que toda a família humana durma em paz.
São nos mínimos detalhes cotidianos que observamos este sentimento, nem tanto em gestos carinhosos, mas em atitudes. Mais uma vez testemunho isto em minha existência aqui na Terra, agora que me recupero de uma cirurgia. A cirurgia em si é beleza, mas o que passei antes e venho passando na recuperação são o que pega...
Eu tive que esperar três semanas para me operar, após descobrir que milhares de pedras na vesícula boiavam aleatoriamente, entupindo de vez em quando um buraco lá. Quando um delas fazia graça, eu tinha dores. E aí vocês me perguntam por que eu esperei pra fazer a cirurgia. Ora! Eu tive que me preparar para parar de trabalhar, com tantas obrigações que eu tenho, além de ter que deixar minhas pacientes doentes com toda a segurança, caso eu empacotasse.
Deu medo. Não medo de cirurgia, mas do pós operatório. Talvez por ser médica, eu fico de antena em pé com os cuidados da enfermagem. Tanto é que quase me enfiaram uma medicação endovenosa que eu não podia usar, a qual estava relatada no meu pulso, na porta do quarto do hospital e no prontuário.
Graças a Deus eu tive ao meu lado um anjo da guarda, talvez mais que isto: um cão de guarda: Célia, uma amiga. Não uma amiga de convívio, mas uma pessoa conhecida, que de repente foi delegada para cuidar de mim e demonstrou ser a melhor amiga do mundo. Ela passou a noite inteira sem pregar os olhos e, como eu recomendei, me avisava o que queriam meter na minha veia. Eu não queria dormir, nem ficar abobalhada com remédios.
Foi horrível pra ela, tadinha. Foi um tal de molhar minha boca o tempo todo, colocar comadre, me cobrir, me descobrir... Nossa, tantas coisas! E aí liga o meu cirurgião me dando bronca, dizendo que eu tinha que aceitar que fossem administrados os medicamentos tal e tal:
-Mas, doutor, eu não estou enjoada!
- Não se meta!Você vai vomitar, sim!
-Ah, vou, é? Tá bem, doc...
Desliguei o telefone e mandei o remédio voltar. Eu já estava doidona com a medicação pra dor. Com mais uma droga eu ia apagar e minha pressão ia lá pro fundo da terra. A enfermagem ficou mais doida que eu. E Célia, em silêncio, como um monge no monastério, só movia os olhos de lá pra cá, tentando cumprir com sua função, mas sem deixar que a coisa extrapolasse.
E cadê meu anestesista?! Ele tinha se prometido aparecer após a cirurgia pra me vigiar, e nada. Ele não apareceu! Ele estava com o pai muito doente e sabia que se não mentisse, eu não ia aceitar ser operada.
Meus amigos médicos estavam ocupados e meu grande amigo Décio, meu auxiliar, se recuperava de uma grande cirurgia, realizada dias antes. Eu só pensava nele e adquiria força e segurança pra mim mesma, uma vez que guerreiro mesmo é ele. Um grande guerreiro. Se ele pudesse, estaria lá comigo, mas a gente estava junta, pois nos comunicamos espiritualmente já de longa data.
Pessoas lá fora participavam nesta minha empreitada. Todas com problemas seríssimos na vida:
Diamar, delegando funções, administrando as coisas. Quieta no seu canto, pronta pra agir quando necessário.
Mairá indo ao meu consultório pra marcar consultas, pegar as contas, anotando os recados. Ela se sentiu o máximo! A minha Dona Menô adorou ser a secretária da vez.
Flávio, sempre pronto pra me levar aonde eu quiser, sempre disposto a me ajudar na hora que for.
Meus médicos, Expedicto, Vinícius, Eduardo Flores, Heitor, todo eles antenados - porque eu os coloquei de sobreaviso. E não posso deixar de lembrar que o sucesso de tudo se deveu a Celso, o cirurgião, que me aguentou bastante, como também a anestesista Dayse, superprofissional.
Shirley e sua mãe, Íris, que também passou a ser minha mãe, cuidando de mim, me alimentando; cedendo sua casa pra eu ficar; zangando comigo porque eu fazia esforço. Eu tive que fugir de lá no terceiro dia, porque eu ia enlouquecer com tanto mimo. Eu tinha que trabalhar, e por elas eu devia ficar um mês deitada, no bem bom.
Márcia Garcês, que mesmo não conseguindo mais falar ou se mover, por conta de esclerose múltipla, manda sua mãe Ruth me ligar todos os dias e fica danada porque eu não vou à sua casa. Podem deixar, amigas. Assim que eu conseguir digerir direito os alimentos, coisa que ainda está difícil, vamos marcar um encontro. E estarei de novo no verão na Praia para Todos com vocês, tomando aquela cervejinha e tomando banho de vários sóis, todos aqueles que iluminam nossa trajetória juntas.
Mauríco Galliet, Mônica Bronzoni, Aline Cunha, Celize, Juju e tantas outras pessoas que me ajudam, não só no financeiro, mas pra qualquer coisa que eu peça. São muitos os soldados de prontidão.
E, como se não bastasse, aparecem subitamente outros anjos, quase anônimos, tal como Olinda, com aqueles olhos lusitanos que parecem que vão marejar a qualquer momento. Ela não é apenas uma paciente, pois passou a ser uma amiga, de tantos anos que nos conhecemos. Ela acha que eu nunca como direito e vive me levando coisinhas de lanche
Lembro que num dia de Natal eu ia ficar ao lado de uma amiga que estava internada e eu quis levar pra ela bolinho de bacalhau. Liguei pra Olinda e perguntei se ela tinha uns de sobra. Ela entregou nn minha casa uma ceia inteira... E ontem, sem mais nem menos, ela me trouxe o sacolão todo: frutas, legumes, verduras de montão (além de um chouriço português legitimo, que eu vou comer daqui uns meses). Tudo que eu estava precisando, por incrível que pareça. E com um detalhe: ela não sabia que eu estava operada e preciso fazer dieta rigorosa.
Perguntando a ela o porquê daquilo, ela não soube responder, mas eu sei. É empatia, paranormalidade e, principalmente, amor.
Eu posso não ter todos que desejo ao meu lado, mas tenho bem mais amigos que eu mereça.
Leila Marinho Lage
Rio, 05 de julho de 2015
http://www.clubedadonameno.com
https://www.youtube.com/watch?v=kliKIb6fmX4
Dizem que o mundo está um caos e que só existe desesperança; que as pessoas estão cruas, egoístas, más, que tudo gira em função de interesses e que a mola que nos sustenta é aquela que nos coloca lá em cima, acima dos outros. Não é verdade!
Pode ser que a maioria seja assim, mas o que eterniza a nossa raça e faz com que nossa espécie sobreviva é o amor, seja na nuance que for desenhado. No quadro da vida o que dá o tom é o amor. E mesmo que sejam poucos os que compreendam e tenham este poder, são esses que fazem a cama todos os dias para que toda a família humana durma em paz.
São nos mínimos detalhes cotidianos que observamos este sentimento, nem tanto em gestos carinhosos, mas em atitudes. Mais uma vez testemunho isto em minha existência aqui na Terra, agora que me recupero de uma cirurgia. A cirurgia em si é beleza, mas o que passei antes e venho passando na recuperação são o que pega...
Eu tive que esperar três semanas para me operar, após descobrir que milhares de pedras na vesícula boiavam aleatoriamente, entupindo de vez em quando um buraco lá. Quando um delas fazia graça, eu tinha dores. E aí vocês me perguntam por que eu esperei pra fazer a cirurgia. Ora! Eu tive que me preparar para parar de trabalhar, com tantas obrigações que eu tenho, além de ter que deixar minhas pacientes doentes com toda a segurança, caso eu empacotasse.
Deu medo. Não medo de cirurgia, mas do pós operatório. Talvez por ser médica, eu fico de antena em pé com os cuidados da enfermagem. Tanto é que quase me enfiaram uma medicação endovenosa que eu não podia usar, a qual estava relatada no meu pulso, na porta do quarto do hospital e no prontuário.
Graças a Deus eu tive ao meu lado um anjo da guarda, talvez mais que isto: um cão de guarda: Célia, uma amiga. Não uma amiga de convívio, mas uma pessoa conhecida, que de repente foi delegada para cuidar de mim e demonstrou ser a melhor amiga do mundo. Ela passou a noite inteira sem pregar os olhos e, como eu recomendei, me avisava o que queriam meter na minha veia. Eu não queria dormir, nem ficar abobalhada com remédios.
Foi horrível pra ela, tadinha. Foi um tal de molhar minha boca o tempo todo, colocar comadre, me cobrir, me descobrir... Nossa, tantas coisas! E aí liga o meu cirurgião me dando bronca, dizendo que eu tinha que aceitar que fossem administrados os medicamentos tal e tal:
-Mas, doutor, eu não estou enjoada!
- Não se meta!Você vai vomitar, sim!
-Ah, vou, é? Tá bem, doc...
Desliguei o telefone e mandei o remédio voltar. Eu já estava doidona com a medicação pra dor. Com mais uma droga eu ia apagar e minha pressão ia lá pro fundo da terra. A enfermagem ficou mais doida que eu. E Célia, em silêncio, como um monge no monastério, só movia os olhos de lá pra cá, tentando cumprir com sua função, mas sem deixar que a coisa extrapolasse.
E cadê meu anestesista?! Ele tinha se prometido aparecer após a cirurgia pra me vigiar, e nada. Ele não apareceu! Ele estava com o pai muito doente e sabia que se não mentisse, eu não ia aceitar ser operada.
Meus amigos médicos estavam ocupados e meu grande amigo Décio, meu auxiliar, se recuperava de uma grande cirurgia, realizada dias antes. Eu só pensava nele e adquiria força e segurança pra mim mesma, uma vez que guerreiro mesmo é ele. Um grande guerreiro. Se ele pudesse, estaria lá comigo, mas a gente estava junta, pois nos comunicamos espiritualmente já de longa data.
Pessoas lá fora participavam nesta minha empreitada. Todas com problemas seríssimos na vida:
Diamar, delegando funções, administrando as coisas. Quieta no seu canto, pronta pra agir quando necessário.
Mairá indo ao meu consultório pra marcar consultas, pegar as contas, anotando os recados. Ela se sentiu o máximo! A minha Dona Menô adorou ser a secretária da vez.
Flávio, sempre pronto pra me levar aonde eu quiser, sempre disposto a me ajudar na hora que for.
Meus médicos, Expedicto, Vinícius, Eduardo Flores, Heitor, todo eles antenados - porque eu os coloquei de sobreaviso. E não posso deixar de lembrar que o sucesso de tudo se deveu a Celso, o cirurgião, que me aguentou bastante, como também a anestesista Dayse, superprofissional.
Shirley e sua mãe, Íris, que também passou a ser minha mãe, cuidando de mim, me alimentando; cedendo sua casa pra eu ficar; zangando comigo porque eu fazia esforço. Eu tive que fugir de lá no terceiro dia, porque eu ia enlouquecer com tanto mimo. Eu tinha que trabalhar, e por elas eu devia ficar um mês deitada, no bem bom.
Márcia Garcês, que mesmo não conseguindo mais falar ou se mover, por conta de esclerose múltipla, manda sua mãe Ruth me ligar todos os dias e fica danada porque eu não vou à sua casa. Podem deixar, amigas. Assim que eu conseguir digerir direito os alimentos, coisa que ainda está difícil, vamos marcar um encontro. E estarei de novo no verão na Praia para Todos com vocês, tomando aquela cervejinha e tomando banho de vários sóis, todos aqueles que iluminam nossa trajetória juntas.
Mauríco Galliet, Mônica Bronzoni, Aline Cunha, Celize, Juju e tantas outras pessoas que me ajudam, não só no financeiro, mas pra qualquer coisa que eu peça. São muitos os soldados de prontidão.
E, como se não bastasse, aparecem subitamente outros anjos, quase anônimos, tal como Olinda, com aqueles olhos lusitanos que parecem que vão marejar a qualquer momento. Ela não é apenas uma paciente, pois passou a ser uma amiga, de tantos anos que nos conhecemos. Ela acha que eu nunca como direito e vive me levando coisinhas de lanche
Lembro que num dia de Natal eu ia ficar ao lado de uma amiga que estava internada e eu quis levar pra ela bolinho de bacalhau. Liguei pra Olinda e perguntei se ela tinha uns de sobra. Ela entregou nn minha casa uma ceia inteira... E ontem, sem mais nem menos, ela me trouxe o sacolão todo: frutas, legumes, verduras de montão (além de um chouriço português legitimo, que eu vou comer daqui uns meses). Tudo que eu estava precisando, por incrível que pareça. E com um detalhe: ela não sabia que eu estava operada e preciso fazer dieta rigorosa.
Perguntando a ela o porquê daquilo, ela não soube responder, mas eu sei. É empatia, paranormalidade e, principalmente, amor.
Eu posso não ter todos que desejo ao meu lado, mas tenho bem mais amigos que eu mereça.
Leila Marinho Lage
Rio, 05 de julho de 2015
http://www.clubedadonameno.com
https://www.youtube.com/watch?v=kliKIb6fmX4