O Cabaré da Lena
Cabaré da Lena!
Hoje é domingo. Estou no exercício da matutagem, no espaço mais intensamente interativo que existe numa casa, a cozinha. Ao fundo, nossas rádios 100% sertanejas. A simplicidade e profundidade de algumas das letras musicadas, muitas vezes me emocionam e me fazem refletir sobre a inevitável condição humana: a inexorável solidão.
Mais cedo, antes disso, estive visitando um amigo, um ex funcionário da fazenda. Ele já foi tema de minhas aventuras literárias. Naquele tempo tratei do conforto e da extrema segurança do útero materno, único espaço capaz de oferecer condições vivencias que fazem frente ao que hoje vagueia nas minhas reflexões: a fragilidade e o desamparo humano.
Meu colega está idoso, nem tanto, mas deu um azar tremendo, aquilo que é esperado acontecer espontaneamente, foi drástica e definitivamente antecipado por um derrame. Não daqueles fulminantes, dos que deixam sequelas e incapacidade que escancara a fragilidade e dependência do homem.
Ouvir minha mãe, de quase 90 anos, cantarolar, de madrugada, as modinhas do seu tempo e rememorar o cotidiano é emocionante e glamoroso, mas presenciar o sofrimento de meu amigo derramado, ao se separar de sua companheira internada num sanatório, é constrangedor e muito triste. Os dois, meu amigo e minha mãe, estão vivenciando o inevitável da condição humana: a solidão. A diferença é que minha mãe chegou a esse tempo de maneira espontânea, cercada dos ambíguos cuidados familiares e meu amigo, pelos caprichos do destino, se viu obrigado a perder, além da independência, a atenção de sua cuidadora “maluca”, é para chorar!
Desde que somos expulsos do paraíso, do útero materno, ora ou outra, mais ou menos intensamente, o ser sofre a indescritível sensação de fragilidade e desamparo.
Esta dor existencial fica clara e evidente entre os idosos e as pessoas, que por um motivo ou outro, ficam dependentes, e não há como conciliar os apelos mentais com as forças do corpo. Mas não é sentimento estranho entre jovens e adultos, particularmente, nos momentos em que o cotidiano faz exigências para as quais eles não estão emocionalmente preparados para enfrentar e não encontram o acolhimento necessário que os ajude a superar a dificuldade momentânea.
O azar do meu amigo e da minha mãe é que eles não recorrem ao Cabaré da Lena. Lá, como diz a letra musicada, é o lugar do socorro emocional, espaço para aliviar a sensação de fragilidade e desamparo, ambiente onde se espanta a solidão existencial!
Todos nós sabemos, só agora!
João dos Santos Leite
Psicólogo
05/07/2015