João Batista
                   
forró e foguetes



        Este ano, meu São João será em Penedo.  Ivone e eu seremos hóspedes de um convento franciscano.
        Apesar de ficar hospedado em um dos mais bonitos monastérios serfáficos do Brasil, não devo desistir do forró. 
        A festa joanina em Alagoas - um pedacinho do destemido Nordeste -, deve ser autêntico. Não faltará uma sanfona, um triângulo e uma zabumba.
          Confesso, entretanto, que o São João, com seus rojões, foguetes, traques, pistolas, atrevidos busca-pés e  fogos-de-vista, não é a festa à qual entrego-me de corpo e alma. Prefiro festas serenas, silenciosas; como o Natal.
           Nem por isso, deixo de dar o maior valor à mesa e às músicas juninas, lembrando, todos os anos, de reverenciar o saudoso Luiz "Lua" Gonzaga, o maior "forrozeiro" do Brasil . 

                         "Olha pro céu, meu amor;/ olha como ele está lindo;/olha pra´quele balão multicor;/ que lá no céu vai surgindo." 

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        Soltar balões sei que é proibido. Mas falar sobre eles, não se comente crime algum. 
        Verdade é que os balões já foram o encanto das noites de São João. Eu, rapazinho, mandei dezenas para o sidéreo espaço, levando ternas mensagens... Muitas não chegaram ao seu destino: desapareceram com o balão em chamas...
          Sempre que recordo os balões, me vem à lembraça o que, numa de suas inteligentes crônicas, disse  Antônio Maria: "Ah, eu gostaria tanto que os meus olhos ainda se encantassem, acompanhando o vôo dos balões até à altura em que eles se transformam em estrelas."

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        Deixo os balões de lado, para falar de João Batista, o grande homenageado na noite do dia 23 de junho. E  não se pode falar sobre ele, sem  recorrer  à Bíblia . 
          Nos Evangelhos, pelos menos nos Canônicos, João Batista não aparece como fogueteiro; um cidadão chegado a forrós e quadrilhas; um bebedor de qualquer tipo de bebida, alcoólica ou não. 
         Sabe-se até, que ele era um cara intransigente, fiel ao que muitos chamam de "austeridade monástica".  Para o escritor Artur Azevedo, ele "foi santo melancólico, e, no entanto,/ Passa aos olhos do vulgo/ Pelo mais brincalhão do calendário."
          Não custa lembrar, mais uma vez, que o Precursor foi degolado porque criticou, publicamente  - "Não te é lícito possuir a mulher do teu irmão" -,  o comportamento incestuoso de Herodes Antipas, na trama que envolveu Herodíade, sua cunhada, e Salomé, filha de Herodíade.

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O cardápio junino:  é farto e variado.
        Mas nunca entendi por que o menu são-joanino é tão robusto. Pelo que se sabe, com base, evidentemente, nos textos sagrados, o Batista não era um  glutão; um sujeito guloso. 
       Vivia, modestamente, no deserto da Judéia alimentando-se de mel silvestre, insetos e gafanhotos. Por que, então, na sua festa, tanta pamonha, tanta canjica, tanto milho verde, tanto licor?

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        Por mais que me esforce, não consigo compreender por que São João Batista, um santo tão recatado,  é festejado, na sua noite, com tamanha algazarra.
       Mas não estou aqui para jogar areia no brinquedo de ninguém; e muito menos para engrossar o bloco dos "desmancha prazeres".
        Esqueçam, pois, o que acabaram de ler. 
        Dançando forro e bebendo um bom licor, brindem, até o sol raiar, o primo de Jesus.  João Batista vê isso há milênios, e nunca reclamou desse aranzel.
 
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 16/06/2007
Reeditado em 05/11/2020
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