VIRGEM
 
"Virgo  
Vertigo"

Paulo Leminsky  
 


 
Nasci em setembro, naquela parte do mês em que nascem os chatos dos virginianos. Assim sou virgem desde que nasci. Em quase tudo comprometo as convicções dos astrólogos a respeito dessa casa astral. Principalmente as convicções desses astrólogos de jornais diários. Azar do signo, sorte minha. Uma amiga, astróloga nas horas de folga, falou que tudo depende muito da conjunção, ou disjunção, não sei bem, astral do momento do nascimento. Para tal era necessário saber também do horário de nascimento. Liguei para minha mãe pra saber o horário. Gostando do jogo, ela me deu um monte de informações. Eu nasci numa madrugada chuvosa, talvez a primeira chuva daquele distante ano de 1966, alguma coisa entre 3 e 4 horas da matina. Segundo ela, isso aconteceu porque comeu na panela, sem usar prato, durante a gradidez. Assenti com a opinião dela, para evitar que o assunto se alongasse. Então minha amiga fez meu mapa astral. E ele era um desenho danado de bonitinho. Até pensei em colocá-lo numa moldura. Ainda bem que me esqueci da ideia. Pois sou dessas pessoas que nem sabem onde está o diploma de mestrado. Descobri que eu tenho alguma relação com marte, embora eu não tenha qualquer espírito marcial, exceto quando estou bêbado. Que sou terra para tudo que é lado. E, o que mais impressionou, que meu ascendente é touro. De fato levo uma vida de curral, cercado de touros por todos os lados. Minha mãe, minha esposa, meus dois filhos, 4 de 8 sobrinhos, e uma penca de amigos são todos taurinos. Desconfio que até meus 4 cachorros sejam taurinos. Provavelmente nascidos em maio. Isso não é ascendência, é, isto sim, uma maldição pra lá de chifruda. Pensei até em botar crença nessa coisa de zodíaco. Que nada, sou muito terra, tendente à descrença, meio São Tomé, para botar fé nessas coisas de misticismo. Não sou místico nem quando vejo o tinhoso na minha frente. E olha que isso já aconteceu um monte de vezes. Talvez por isso em determinado momento da vida eu tenha deixado minha vocação celibatária de lado, e deixado de ser virgem. Talvez nem isso. O negócio não foi assim deliberado. Foi vertigem mesmo. Aquela coisa de conversa pra cá, conversa pra lá. Conversa sobre signo. Eu conversando mole disse: "digo que sou virgo, sou puro vertigo e gosto ver ti comigo", um plágio sem vergonha do Paulo Leminsky. Foi um "Fiat Lux!". Ela interpretou a frase como cantada, de repente estávamos os dois pelados, colocando e tirando aquilo daquilo. Depois disso não sou mais virgem. E pra signo nem ligo. Só brinco, pois sou afeito ao lúdico. Pensei em dar bola para horóscopo chinês, que é ainda mais esquisito. Nesse caso sou cavalo desde o focinho até o rabo. Mas depois pensei bem, não tenho o porte elegante do bicho, nem aquela vocação pra dar coice. Nem gosto de ser montado, esporeado ou chicoteado. Então mandei o cavalo pastar em outro gramado. Agora estou aqui, puro terra, terra que virou lama, onde estou até o pescoço atolado.