UM MINI-CONTO: A VIDA DE RAIMUNDO
Raimundo ficou órfão de mãe aos dois anos de idade. O pai de Raimundo casou-se a segunda vez e foi morar com outra família, ficando, Raimundo mais uma vez órfão também. Aos dois anos Raimundo foi morar na casa dos seus avós paternos com suas tias. Ali naquele ambiente triste e tacanho o menino cresceu e passou a infância, adolescência e também a juventude. Raimundo criou-se liberto, fazendo sempre o que quis. Num meio de parentes e primos, ele era malvisto, era tratado como uma pessoa de péssimos costumes. Logo Raimundo sentiu falta do carinho materno, do arrimo de sua genitora. Os seus tios nunca lhe deram atenção, nunca lhe trataram bem. Com sete anos de idade Raimundo foi levado para uma escola local, para ser alfabetizado. Nesta primeira escola deu mostra de um menino ativo e inteligente, embora não tenha aprendido quase nada. A professora era pobre de cultura e espirito. Três anos passou Raimundo estudando nesta escola paupérrima junto a outros meninos tristes como ele. Entre onze ou doze anos, Raimundo aprendeu de verdade passando a ser um amante dos livros e da cultura. Logo cedo ele conheceu que não dava para o cabo da enxada, que não toparia o pesado. Entre quinze ou dezesseis anos, começou a sentir a vocação pelas artes de toda espécie, pensando em ser artista, sentiu grande rejeição pelos seus próprios amigos e parentes. Sem mestre, sem ajuda de ninguém, conseguiu fazer sonetos e recitar na roda de amigos. Ninguém acreditava que aquele menino feio, triste e desajeitado pudesse ser um dia um grande poeta. Ele trazia a força do sangue materno dos Oliveiras de Quixeré. O seu ancestral paterno também tinha o sangue artístico. Crescendo nesse meio ignorante, Raimundo procurou se fazer só mesmo. Sem nenhuma condição financeira, sem ajuda de ninguém ele foi crescendo aos poucos. Como estudioso foi lendo e tentando mostrar á sociedade hipócrita, que tudo depende da força de vontade. Sempre foi um menino triste, sem amigos, sem muito afeto, no entanto muito curioso com a sabedoria. Com trinta anos passou por um casamento desastroso, tendo deixado uma filha sem pai aos sete anos de idade. Criado na ternura e sem afeto materno, Raimundo aprendeu a sentir os impactos da vida desde criança. Nunca teve vida boa, nunca vestiu um paletó, nunca foi apadrinhado por ninguém. Tudo quanto consegui foi com muito sofrimento. Ele traz consigo o amor ao próximo, embora não tenha religião nenhuma, apenas acredita num ser supremo e nada mais deste mundo. Conheci Raimundo, quando ele tinha uns vinte anos e morava na casa de seu avô paterno, em Poço de Onça. Fui várias vezes á casa de Raimundo, para ouvi-lo cantar repente ao som da viola e recitar versos. Á casa em que morava Raimundo tinha um enorme tamarindo e debaixo desta arvore centenária, ele tocava viola e cantava repente, para os transeuntes que passavam ali quase todos os dias. Teve ele um inicio literário muito importante, sendo admirado pelos seus conterrâneos, menos pelos seus parentes que sempre debocharam da sua arte de trovador. Raimundo nunca se envolveu com gente de baixo caráter, ele sempre procurou viver no meio mais elevado, no meio mais cultural, onde pudesse ser entendido e aceito como um artista de talento. A sociedade medíocre nunca procurou saber na verdade quem era Raimundo como pessoa humana, como poeta e como estudioso. Diante da ignorância do povo, ele passou despercebido, sem ser entendido em nada e tampouco respeitado. Raimundo lendo Machado de Assis descobriu que o ser humano não merece confiança em coisa alguma. Quanto mais bem formado for o ser humano, mais traidor ele se torna. Convivendo com a fauna humana ele pôde constatar toda e qualquer espécie de falsidade. A politica, para Raimundo não tem nenhum valor humano porque ele não acredita no ser humano e muito menos no poder publico. Como Lima Barreto, Raimundo vê a fauna politica brasileira de péssimo caráter. Portanto Raimundo procurou o isolamento, a solitude e se afastar do vandalismo brasileiro e do egoísmo de um povo que só pensa em dinheiro e esquece dos valores humanos.
Autor: Antônio Agostinho