Minha rua, minha ladeira
Moro em uma ladeira que não tem castelo nem princesa encantada, mas tem um prédio de muitos andares que fazem a moldura de vidas simples dentro da simplicidade do anonimato. Não há como descer a rua sem eira nem beira. E depois, como subir?
É melhor desistir e me divertir com o Pôr do Sol vermelho de luz ou com o olhar voltado para o céu em noites de Lua Cheia. A alternativa é reorganizar a vida para dar cor à rotina ou à retina acinzentada do cotidiano e tudo o mais que se possa acrescentar ao dia a dia.
Por residir na via pública cuja geografia não se explica, é bom até escrever palavras que não dizem nada, fazer arte sem arte, divertir-me com o vento uivante do morro, que conta histórias, conta delírios e zomba da condição humana. Às vezes, é suave, canta, às vezes desafina, mas faz as árvores dançarem um improvisado bailado.
Debruçada na janela, vejo muitos anos de vida desfilarem diante de meus olhos. Passaram lentamente sem eu reparar neles, preocupada como estava em viver cedo, fazer tudo cedo, menos morrer, porque, como diz Drummond, é contra meu regulamento interno. Não há mais nada a dizer e muito a entender.
Não me refugio na torre encantada, pois moro no oitavo andar, na rua que se prolonga até bem perto do céu. Talvez ela tenha começado em Itabira e veio dar em meu coração. Imaginação não respeita realidade.