Papai Noel existe
 
Esta foi mais uma daquelas noites longas, noite de insônia, de madrugada interminável, em que se fica perambulando pela casa, sem encontrar o espaço que nos dê o aconchego e faça dormir, a cabeça fervilhando de pensamentos, de lembranças. No canto da sala escura, as lâmpadas apagadas do espectro de uma árvore de natal inexistente projetam sombras nas paredes das lembranças de natais passados e que se perderam no tempo.

Como em um filme projetado no mais íntimo de mim, revejo-a ajudando sua mãe a decorar a árvore, você na pontinha dos pés para pendurar os enfeites, sua expressão de espanto e decepção ao se quebrar mais uma das bolas coloridas, seus olhinhos brilhando mais intensamente que as próprias lâmpadas que formam como que um colar que a envolve e abraça.

Ah, e novamente a vejo, sempre gaiata, com o jogo de lâmpadas enrolado em sua cabeça, formando uma coroa de rainha, com as lâmpadas piscando e refulgindo cores como se fossem pedras preciosas, dois pingentes enormes como brincos emoldurando seu rosto lindo, sereno, de expectativa, de pura felicidade, fazendo caras e bocas, poses de modelo e nos divertindo.

Ao pé da árvore, embrulhos de presentes com fitas e laços coloridos e, encostada ao tronco, a cartinha que você escreveu a Papai Noel, dizendo que, mais uma vez, você foi uma menina boa e obediente e relacionando os presentes que gostaria de ganhar, sempre terminando pedindo pela volta do Zero.

E, nos últimos anos, como você relutava em escrevê-las, em uma questão ainda não bem resolvida quanto à existência de Papai Noel, que você insistia em que era eu, único conhecedor de todos os seus desejos. E eu lhe dizia que era um simples mensageiro dele, incumbido de retribuir-lhe toda a felicidade que você tinha nos dado durante todo aquele ano, durante toda a sua vida.

E, já menina-moça, você ainda relutava com os meus argumentos, algumas vezes afirmando categoricamente que já sabia de toda a verdade e que não era mais criancinha, mas sempre correndo para a janela, nas noites de natal, chegando sempre atrasada e não a tempo de ver o trenó que eu dizia acabara de passar e que agora se encontrava escondido por uma nuvem – que pena!

Você até mesmo ouvia a risada HO – HO – HO de Papai Noel e o bimbalhar dos sinos pendurados nos pescoços das renas e isto era prova irrefutável de sua existência. E eu lhe dizia que ele existe, mas somente para quem nele acredita, levando-a a me olhar com um sorriso meio que de dúvida, meditativa sobre esta pequena mentira-grande verdade.

E hoje, você como Papai Noel, sei que não mais posso tocá-la, abraçá-la, sentá-la no colo e cobri-la de beijos e carinhos; contudo, mais que nunca, eu a vejo sorrindo e brilhando no recôndito de minha saudade e no mais puro de meus sentimentos; e eu acredito em você, sei que você existe em outra dimensão e receberá todas as cartinhas que sempre lhe enviarei, para o mesmo endereço de Papai Noel, a quem você deverá estar ajudando, cuidando de suas renas e ajudando-o a fazer os presentes de natal para todas as crianças do mundo.

P.S.: não “escambalhe” muito a oficina de Papai Noel!
LHMignone
Enviado por LHMignone em 22/09/2005
Reeditado em 19/10/2013
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